Confira, em vídeo, trechos de seus discursos históricos:

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À SOMBRA DE CÉSAR
Mussolini em 1941, quando já havia se aliado a Hitler, a quem chamava de
imitador: tentativa fracassada de reviver as glórias passadas do império romano

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Poderia ser um monólogo de algum personagem shakespeariano na completa solidão do poder. A divagação que se segue, no entanto, é de autoria do ditador italiano Benito Mussolini (1883-1945), acossado pela decadência moral e física na derrocada final: “O que é a vida? Poeira e altares, altares e poeira.” Essa frase acaba de ser resgatada pelo historiador francês Pierre Milza na biografia “Mussolini” (Nova Fronteira), que reconstitui a trajetória do fundador do fascismo à frente do governo da Itália por mais de duas décadas. Especialista nesse período conturbado do século passado, Milza teve acesso ao chamado “arquivo secreto” de Mussolini, guardado em Roma, especialmente à correspondência sigilosa e aos documentos de uma seção nomeada Secretaria Particular do Duce. Por ter sido jornalista antes de comandar o seu país, o estadista tinha grande habilidade com as palavras e “uma paixão quase maníaca pelo detalhe”, deixando para deleite de pesquisadores um vasto leque de escritos pessoais. É fácil imaginá-lo com a mão na cintura e o queixo projetado para a frente, postura que para Milza “acentuava a aparência viril e voluntariosa”. Ele gostava de ostentar o seu “crânio dolicocéfalo” (com largura menor que o comprimento e prova de uma suposta superioridade racial) e passou a raspar o cabelo lançando a moda das “cabeças à romana”, que desaguaria no visual dos skinheads.

Embora seja uma biografia histórica, mais focada na figura pública, o perfil que o historiador apresenta do Duce não evita os detalhes íntimos e anedóticos. Mussolini, filho de um ferreiro e de uma professora primária, é apresentado como um homem de modos rudes, mas dotado das qualidades do ator nato, de grande valia na manipulação das massas. O biógrafo chega a levantar a hipótese que mesmo o seu dom-juanismo tinha algo de calculado, já que ele não escondia o gosto pelas amantes. Essa é a avaliação de sua mulher, Rachele, reproduzida no livro: “Como todos os italianos, ele achava que o sexo feminino não devia passar de um certo nível na escala social e que seu papel devia se limitar ao ambiente doméstico.” Se essa postura machista valia para a esposa, certamente ela não se aplicava às admiradoras que disputavam curtas “audiências” com o ditador. Eis outro depoimento selecionado por Milza, do camareiro Quinto Navarra que trabalhou na sede do governo, o Palazzo Venezia: “As senhoras visitantes eram introduzidas na Sala do Mappamondo, de onde saíam uns dez minutos mais tarde, sem que nada em seu traje indicasse que tivesse acontecido entre elas e o chefe do governo algo mais que uma troca de palavras amáveis.” Ele relata que o Duce “recebia mulheres de todos os tipos e de todas as condições, se não de todas as idades”. Mas preferia as balzaquianas e não fazia muitas exigências em relação à aparência física.

Diferentemente de Adolf Hitler, que detestava as atividades burocráticas, Mussolini adorava passar horas com despachos e reuniões governamentais. Ele chegava a varar a noite trabalhando e por isso reservava tão pouco tempo aos encontros eróticos, que aconteciam no fim de tarde, entre 18h e 18h30. Navarra, cujo livro de memórias foi uma das inúmeras obras consultadas por Milza, lembra que as investidas do Duce eram rápidas, brutais e explosivas, e que ele não apreciava os galanteios preliminares e tampouco as gentilezas da despedida. “Nem um café, um licor ou mesmo um pedaço de bolo”, salientou Navarra. No grupo das mulheres notáveis, o livro lista uma série de “amigas”: Ida Dalser, Margherita Sarfatti, Clara Petacci, Magda Fontages, Angela Curti e até a atriz Alida Valli, musa dos primeiros filmes de Luchino Visconti. Se o caso se tornava incômodo, dava-se logo um jeito de tirar a amante do campo de ação, como aconteceu com Romilda Ruspi – seu marido foi declarado louco e ela, presenteada com um posto de gasolina.

Sujeito a crises depressivas e períodos de euforia, o bipolar Duce detestava a paisagem natural dos lagos, que lhe provocava melancolia. Coincidência ou não, foi para a região do Lago de Como, no norte da Itália, que os nazistas o levaram no final da Segunda Guerra, quando o seu destino era alvo de militares americanos, ingleses e da resistência italiana, os partigiani. Os capítulos finais, que tratam de sua misteriosa execução pelos antifascistas, reservam os momentos mais polêmicos da biografia. Milza bate na tecla de que Mussolini teria sido, na verdade, assassinado a mando do primeiro-ministro inglês, Winston Churchill. Ele estaria preocupado com a possibilidade de vir à luz a correspondência que trocara com o Duce, a quem teceu elogios nos tempos de esquerdista.  

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