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Foi a primeira alteração efetiva na arrumação econômica mundial provocada pela crise financeira. Pittsburgh entrou para a história da economia. Na sexta-feira 25, na cidade da Pensilvânia, a cúpula do G-20 tomou o lugar do G-8 como principal fórum de discussão internacional, com poderes para ditar os caminhos econômicos daqui para a frente, definir políticas sociais e impor medidas ecológicas.

De uma vez por todas, o Brasil e os demais países emergentes passaram de simples coadjuvantes a protagonistas. Na tradicional reunião de chefes de Estado e ministros da Fazenda das 20 maiores economias do planeta, iniciou-se a construção de uma nova arquitetura geopolítica, com uma redistribuição de forças.

Os países dos BRICs, Brasil, Rússia, Índia e China, podem se beneficiar se realmente houver mudanças no Fundo Monetário Internacional e no Banco Mundial – cujas regras adotadas desde o início da década de 1990 são apontadas como causadoras da atual crise financeira. "Se não fosse o G-20, o mundo teria mergulhado numa crise tremenda", disse à ISTOÉ o ministro da Fazenda, Guido Mantega.

Essa visão é compartilhada pelos Estados Unidos, Reino Unido e França. "O G-20 deve ser o fórum de cooperação internacional", defendeu o primeiro-ministro inglês, Gordon Brown. "O G-20 vai estabelecer o caminho do crescimento mundial", reforça o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama. Ficou decidido também que a partir de novembro de 2010, quando ocorre a reunião de cúpula na Coreia do Sul, que o G-20 será um fórum permanente, com realização de uma cúpula anual e três reuniões por ano de ministros da área econômica.

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MUNDO MAIOR
Brown e Obama defenderam ampliação dos poderes do G-20 em substituição ao G-8

No entanto, mais do que discursos, reuniões e agendas, é preciso ter a coragem de alterar a essência do funcionamento da economia.

Há consenso de que o capitalismo precisa ser outro. Atrás da aparente boa-vontade, persiste a resistência das nações ricas em adotar mecanismos efetivos de regulação dos mercados financeiros. Esse é mais um "dogma" que provocou a crise, como definiu o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Outro problema, destacou ele, são os "sinais inquietantes de recaídas protecionistas". Os Estados Unidos, por exemplo, não querem se dobrar às determinações da Organização Mundial do Comércio (OMC) de extinguir os subsídios do algodão contra o Brasil e acabaram de taxar em 35% os pneus chineses.

Cálculos do instituto World Trade Alliance, de Genebra, mostram que um integrante do G-20 quebrou sua promessa antiprotecionista uma vez a cada três dias. "Países ricos resistem em realizar reformas nos organismos multilaterais, como o FMI e o Banco Mundial. É incompreensível a paralisia da Rodada de Doha, cujo acordo beneficiaria sobretudo as nações mais pobres do mundo", disse o presidente Lula, em discurso na abertura da Assembleia Anual da ONU.

Mesmo assim, o Brasil tem bons motivos para comemorar. As medidas de estímulo econômico não serão suspensas até que a recuperação global esteja garantida. E os BRICs vão conseguir aumentar a sua participação no FMI e no Banco Mundial. Os países desenvolvidos aceitaram negociar uma redistribuição das cotas do Fundo.

No rascunho da declaração final da Cúpula de Pittsburgh, admitia-se a transferência de cotas de 5% dos países mais ricos para os emergentes. Mas a resistência de países europeus que perdem espaço com a redistribuição pode adiar a reforma para a reunião do FMI, em outubro, em Istambul. Os BRICs vão insistir numa participação do tamanho de sua importância.

De acordo com o representante do Brasil no FMI, economista Paulo Nogueira Batista Jr., as distorções de representação no Fundo são gritantes. Ele lembra que os países emergentes possuem 50% da economia mundial e a tendência nos próximos anos é que esse peso aumente. "Em poder de voto, a Bélgica é maior do que o Brasil, a Itália é maior que a Rússia e o Reino Unido maior que a China.

A distribuição desigual de cotas e de votos limita nossa atuação", diz Batista Jr. Se os líderes do G-20 resolverem pôr em prática o que foi acertado, o mundo caminhará para um novo ponto de equilíbrio. O governo chinês comprometeu-se a tomar medidas para aquecer o consumo interno e a demanda, o que tende a favorecer não só os Estados Unidos como o Brasil.

Mas assessores do presidente chinês, Hu Jintao, dizem que a solução da crise mundial depende de maior financiamento e ajuda tecnológica às nações em desenvolvimento. Pelos acordos, o G-20 fiscalizará a economia global, com regras mais duras para a atuação dos bancos, até o final de 2012.

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, sugere medidas mais rígidas de regulação, com testes de stress anuais para bancos e uma supervisão dos mercados futuros. A Europa, que defende a regulação, nega-se a admitir tal rigidez. Essa é mais uma luta para os emergentes.

BRASIL, Risco zero

Ao se encontrar com o ministro da Fazenda, Guido Mantega, em Nova York, na terça-feira 22, o vice-presidente para a América Latina da Moody’s, Mauro Leos, trazia boas notícias para o Brasil. A mais conservadora das agências de risco promoveu o País ao primeiro estágio no grau de investimento.

"A economia brasileira está mais forte. Essa nota é pelo desempenho durante a crise", explicou Leos a Mantega. "Esta é uma prova de que a recuperação é consistente e duradoura", disse Mantega à ISTOÉ. Para o presidente do BC, Henrique Meirelles, as outras agências de risco também devem colocar o Brasil em perspectiva positiva. "Seria natural que nos próximos meses a Standard & Poor’s queira empatar o jogo."