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ADAPTAÇÃO
Há quem altere frases de Clarice de acordo com as suas conveniências

Dois novos livros de Clarice Lispector (1920-1977) acabam de chegar às livrarias – “Como Nasceram as Estrelas” e “Clarice na Cabeceira – Romances”, este organizado pelo escritor e crítico literário José Castello. Poderiam ser apenas mais dois lançamentos se a escritora ucraniana naturalizada brasileira não fosse hoje um dos maiores fenômenos de citação em redes sociais, cadernos escolares, objetos de decoração, placas e blogs. O universo “clariciano”, como são chamados os milhares de fãs da autora, se propaga na internet como fogo ao vento. Um blog diz que Clarice está passando por um processo de “cheguevarização”, numa referência à famosa foto, que roda o mundo, retratando o guerrilheiro argentino Ernesto Che Guevara. No mês passado, foi lançado o “Dia C” – 10 de dezembro, data de seu nascimento – para celebrar a obra de Clarice, numa iniciativa da editora Rocco que tem 21 títulos publicados da autora. Segundo o editor Paulo Rocco, a intenção “é manter a obra viva, em permanente circulação de ideias, com eventos e encontros literários pelo País”.

José Castello resume o motivo pelo qual a obra da romancista e cronista comunica-se tão bem com pessoas de diferentes faixas etárias, nível social e intelectual: “A literatura de Clarice toca o coração.” Ele lembra que sua escrita “não é culta”, até porque a autora não se interessava em torná-la assim. E aponta um problema na onda de transcrições de seus pensamentos e reflexões, já que muitas delas “são falsas ou, pelo menos, adaptadas às conveniências de quem as usa”. Ainda assim, ele concebe um lado positivo: “Servem como iscas para atrair os leitores.” Na mesma linha, o biógrafo americano Benjamin Moser considera as reproduções “cafonas”, mas reconhece que elas tiram o caráter hermético da obra, tornando-a “mais popular”. De fato, a fragmentação do pensamento parece ser uma tendência inevitável dos tempos atuais e a pressa faz com que as pessoas prefiram textos curtos. Por isso, grandes nomes como o de Clarice são os mais forjados, copiados e adulterados na internet. Bem ao estilo da escritora, Castello resume o fenômeno: “Isso não é bom nem é ruim. É.”

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Citações famosas da autora
Pensamentos de Clarice que são reproduzidos em redes sociais e ilustram agendas e cadernos escolares

“O que é verdadeiramente imoral é ter desistido de você mesma”

“Liberdade é pouco. O que eu desejo ainda não tem nome”

“Tenho várias caras. Uma é quase bonita, outra é quase feia. Sou um o quê? Um quase tudo”

“Porque há o direito ao grito. Então eu grito”