Brasília tem razões que a própria razão desconhece. Bem esclarecido fique, desde já, que essa peculiaridade detectada na capital federal emana basicamente dos ciclos do poder. No caso em questão, diretamente do plenário parlamentar. Eis que, nos últimos dias, uma patota animada de deputados e senadores decidiu se mobilizar para fazer valer como verdade a idéia de que o mensalão nunca existiu. O caixa 2 corriqueiro e informal foi assim, pela ótica privilegiada desses senhores e senhoras, uma espécie de conto da carochinha, uma brincadeirinha boba que rolou entre seus pares. Teve direito a confissões públicas, flagrantes explícitos e documentos cabais, mas todo esse glacê do mensalão funcionou apenas como um aparato da, digamos, pegadinha. A tropa de choque petista fez um escarcéu daqueles, com xingamentos, ameaças abertas e tudo o que tinha direito para barrar o relatório da CPI que apura o dito-cujo mensalão. Os autores do trabalho bateram o pé, resistiram, aprovaram o parecer. Para o bem geral da Nação, confirmaram: o mensalão existiu. A patota enlouqueceu. Numa dinâmica protecionista e corporativista, a turma correu a salvar outro colega mensaleiro. O ex-presidente do Congresso João Paulo Cunha, usuário confesso do valerioduto, de onde garfou R$ 50 mil, livrou-se da degola da cassação, inocentado por uma maioria silenciosa. Foi o oitavo absolvido. E pelo andar da carruagem, após dez meses de trabalho da CPI, vem mais por aí. Relatórios de conselhos de ética que recomendam perda de mandatos viraram letra morta, vão parar no lixo. E montou-se alhures um teatro do absurdo onde o Brasil, na sua banda pitoresca, absorve a nova e inusitada verdade que diz: houve mensalões, mas sem mensaleiros.