Bolshoi em russo significa "grande". Mas enorme mesmo é o valor gasto até agora na reforma do famoso e histórico Teatro Bolshoi em Moscou, fechado desde 2005 para restauração. O custo total até o momento é seis vezes maior do que o orçamento original. A suspeita é de que o Diretório da Construção, Reconstrução e Restauração, departamento do governo, tenha excedido o pagamento da empresa Kurortproekt, contratada para realizar os trabalhos de reforma. O Comitê Investigativo do Escritório da Promotoria Geral Russa anunciou a abertura de um inquérito criminal para averiguar o desfalque e declarou acreditar que a empresa foi paga três vezes pelo mesmo serviço, o que apontaria um possível desvio feito pela agência federal.

De acordo com o jornal "The Moscow Times", enquanto os contratos oficiais especificavam que a Kurortproekt teria direito a receber 164 milhões de rublos (o equivalente a US$ 5,3 milhões), na verdade, ela já ganhou, de 2003 a 2009, 957 milhões de rublos (cerca de US$ 31,2 milhões). Os investigadores suspeitam de corrupção e analisam irregularidades do contrato entre o Estado e a empreiteira privada que realiza a reforma no teatro que dá nome a um dos principais corpos de balé e ópera da Rússia. O comitê não nomeou nenhum indivíduo sob suspeita e não informou o total da quantia de dinheiro que acredita ter sido desviada.

Porta-voz do Bolshoi, Lyubov Bushayeva negou qualquer mau procedimento realizado pelo teatro e declarou que o responsável pelo processo da reforma é o ministro da Cultura, Alexander Avdeev. "O Teatro Bolshoi não tem absolutamente nada a ver com a reconstrução, ele não pode oferecer nenhuma informação adicional", declarou. A promotoria russa disse ao jornal inglês "The Guardian" que alguns dos milhões gastos na reforma tinham misteriosamente "desaparecido" e poderiam ter sido roubados.

O prédio histórico do Bolshoi começou a ser construído em 1821 e foi aberto em 1825. Frequentado desde o início por czares russos e líderes soviéticos, o teatro, hoje com quase 185 anos, está coberto por um tapume e andaimes e é alvo de investigação da promotoria russa. Depois de décadas de negligência quanto aos descuidos e com a descoberta de problemas que abalavam as estruturas da construção, o espaço foi oficialmente fechado em 2005. A reconstrução visa, entre outros consertos, restaurar a acústica original, reformar o palco, reparar as rachaduras visíveis da fachada e no interior e ainda aumentar o espaço dos camarins.

A reabertura do local estava prevista para 2008 e teve a data adiada para este ano. Agora, novamente, o prazo foi mudado e espera-se que o Bolshoi volte a funcionar em 2011. Enquanto a reabertura não acontece, as performances de balé e ópera são realizadas na nova sede do teatro que também fica na Teatralnaya Ploshad, a praça da construção neoclássica.

A reforma ocasionou uma evasão de turistas do teatro, que, quando pretendem ver o balé ou a ópera do Bolshoi, pensam em assistir ao espetáculo no antigo prédio. "O índice de desinteresse quando se diz que as apresentações não são no velho Bolshoi é muito grande. Muitos dos que assistem às performances na segunda sede são russos e não turistas", disse Gustavo Nunes Leal, proprietário da Tchayka – A Casa da Rússia, em São Paulo, e um dos maiores especialistas brasileiros em turismo na Rússia. Segundo ele, as pessoas preferem assistir ao balé Kirov na antiga construção do Teatro de Maryinski, em São Petersburgo.

O escândalo do Bolshoi é embaraçoso para o Kremlin – sede do governo russo em Moscou – e aconteceu no momento em que o país está tentando acabar com a corrupção. "Esse desvio de dinheiro é muito prejudicial, mas infelizmente o desaparecimento de dinheiro é comum na Rússia. A máfia da bandidagem praticamente não existe mais, hoje é mais a do colarinho branco", disse Leal.

De acordo com informações da agência de notícias da Rússia RIA Novosti, oficiais do Kremlin farão uma outra investigação sobre o gasto da reforma. Na nota, um porta-voz não identificado da empreiteira Kurortproekt alegou que "a empresa estava fazendo o trabalho que tinha sido ordenada a realizar". Caso sejam considerados culpados pelo "desaparecimento" da verba paga até agora, os responsáveis pelo desfalque na restauração do Bolshoi poderão passar quatro anos na prisão.

FOTOS:NATALIA KOLESNIKOVA/ILIYA PITALEV/RIA NOVOSTI/DMITRY ASTAKHOV/AFP