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TAXAR, TAXAR, TAXAR Lula, Mantega e Meirelles: solução fácil

O que, em maio, não passou de um balão de ensaio, agora é para valer. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva insiste em tributar a caderneta de poupança para arrecadar cerca de R$ 1 bilhão por ano. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, anunciou que todos os rendimentos dos depósitos que excederem R$ 50 mil deverão pagar 22,5% de Imposto de Renda, mensalmente, na fonte, a partir de 2010. Mantega, pelo visto, esqueceu-se de desastradas experiências, como as garfadas no rendimento e o brutal confisco do governo Collor, que só serviram para gerar insegurança na classe média e no sistema financeiro.

E parece ignorar que nenhum país no mundo possui mecanismo tão eficaz e confiável para o financiamento da casa própria. Felizmente, a tungada enfrentará resistência política. Até mesmo o líder do governo no Congresso, deputado Gilmar Machado (PT-MG), considera a medida inoportuna. "Acho que podemos esperar mais para avaliar o desempenho da taxa de juros. É melhor deixar esse assunto para o ano que vem", disse ele ao presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, na sexta-feira 18. "Se depender da oposição, não será aprovado", afirma o presidente do DEM, deputado Rodrigo Maia (RJ).

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Em sua defesa, Mantega alega que 99% das cadernetas têm saldo inferior a R$ 50 mil. "Os pequenos poupadores não serão taxados", minimiza o ministro. Há, porém, uma falácia neste argumento. A faixa de 1% que será tributada detém 37% dos recursos da poupança. São quase 970 mil contas que somam mais de R$ 100 bilhões. Podem até ser insignificantes no universo total, mas pertencem a cidadãos de classe média sem apetite ao risco que confiaram no caráter sagrado da poupança e foram incentivados a guardar dinheiro para o futuro. Ao garfar a caderneta, o governo comete o erro primário de confundir poupador com investidor. Não há razão para tributar um aposentado, por exemplo, que acumulou com sacrifício R$ 100 mil e aplicou na poupança com a esperança de receber menos de dois salários mínimos por mês. Aberto o precedente, como adverte o deputado Raul Jungmann (PPS-PE), haverá a tentação de, mais tarde, estender a taxação a depósitos abaixo dos R$ 50 mil.

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Não bastasse o grave erro conceitual, o governo também escorrega quando tenta justificar a medida. Primeiro, alega que a rentabilidade fixa, de 0,5% mais TR, inviabiliza a queda dos juros.

De acordo com Roberto Vertamatti, da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, é consenso entre os economistas que há risco de um repique inflacionário em 2010 e certamente o BC não reduzirá os juros – por sinal já estancou o movimento de baixa na última reunião do Copom.

"Não se devem alterar as regras agora", diz. O segundo deslize foi a adesão automática à tese de que a melhor rentabilidade da poupança pode levar à fuga dos fundos de renda fixa, criando instabilidade no sistema e na gestão da dívida pública. Ora, se o problema é esse, bastava pressionar os bancos para que reduzissem as taxas de administração dos fundos ou, então, reduzir a tributação sobre esse investimento, que ficaria mais atrativo. O governo, porém, preferiu optar pela alternativa mais cômoda de taxar a poupança e aumentar a arrecadação sem fazer esforço. Mas corre o risco de fazer desta facilidade uma dificuldade a mais nas urnas em 2010.

AS ALTERNATIVAS DESCARTADAS

O governo escolheu o pior caminho para promover as mudanças na caderneta de poupança. Mesmo contando com outras alternativas, decidiu jogar mais tributos nas costas do contribuinte. Uma opção seria a redução de impostos que incidem sobre os fundos de investimentos. Segundo o educador financeiro Mauro Calil, uma diminuição do Imposto de Renda ajudaria a fomentar essas aplicações. As alíquotas sobre os rendimentos dos fundos variam de 15% a 22,5%, de acordo com o prazo da aplicação.

"O governo viu como é possível estimular a economia quando reduziu o IPI para a compra de veículos", compara.

Outra solução seria atrelar a poupança à Selic. Ou seja, ela renderia um determinado percentual da taxa básica de juros.

"A saída é deixar o próprio mercado determinar a rentabilidade, de acordo com a oferta e a demanda", diz Paulo César Coimbra, professor da Fundação Getulio Vargas. Para Calil, o governo poderia ainda adotar uma estratégia mais "criativa", como estimular o uso de parte dos recursos da poupança para a compra de ações de empresas públicas a um menor custo. "Ele mexeria com a poupança, mas daria oportunidade para o investidor migrar para empresas sólidas."

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Para os economistas, a taxação pode ser eficaz, no curto prazo, para evitar uma fuga dos fundos de investimentos. No entanto, a proposta não resolve o problema central: abrir espaço para cortes na taxa de juros. Para isso, o governo terá de realizar novas mudanças na poupança. "Estão usando um tapa-buraco. É possível, por exemplo, abrir contas com o nome de outras pessoas da família", afirma Roberto Troster, conselheiro do Conselho Regional de Economia (Corecon). O investidor com muito dinheiro na poupança ainda tem poder de barganha para negociar com o banco vantagens para migrar para outras aplicações. Nesse sentido, a medida tende a prejudicar mais os poupadores com cadernetas próximas aos R$ 50 mil. Perto desse limite, a aposentada Lúcia Bassanese, 63 anos, não sabe o que vai fazer com a sua caderneta. Por considerá-la uma aplicação segura, concentrou todo o seu dinheiro na poupança. "Estou indignada com a taxação da caderneta. Nós já pagamos impostos para tudo", afirma.



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