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AO NATURAL Eduardo Sousa e seus gansos, que vivem livres e se alimentam do que encontram.

Dois anos atrás, em visita à Espanha, o chef americano Dan Barber foi a um restaurante no interior do país e pediu um foie gras de ganso. Ao prová-lo, ficou extasiado com o aroma, a textura e o sabor. Por isso, fez questão de conhecer pessoalmente o responsável pela iguaria, o fazendeiro espanhol Eduardo Sousa, dono de terras na região da Extremadura e herdeiro da Patería de Sousa, que produz foie gras desde 1812.

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                                                      O foie gras pronto

Ao chegar ao local, não acreditou no que viu. Ao contrário da esmagadora maioria dos produtores, ele não mantém os gansos presos nem pratica gavage, que consiste em alimentar aves à força para os fígados engordarem e atingirem o tamanho ideal de 400 gramas para o abate. A técnica existe desde o antigo Egito, mas tem provocado a ira de ambientalistas e é proibida em países como Itália e Alemanha. Os gansos de Sousa vivem soltos e se alimentam do que a terra oferece: grama, ervas, vegetais e frutas, como figos.

Encantado com a qualidade do produto – o foie gras da Patería ganhou o prestigiado prêmio francês Coup de Coeur por inovação em 2006 – e pela maneira como ele é feito, Barber decidiu levar a técnica para os Estados Unidos, para uma fazenda em Pocantico Hills, a 48 quilômetros de Nova York. "O segredo está em oferecer às aves um hábitat adequado e fazê-las crer que são selvagens. Assim, encontrarão comida e permanecerão na região", diz Sousa, que, desde o prêmio, tem viajado o mundo divulgando a prática. No processo convencional, a ave é alimentada basicamente de milho, à força, por 12 dias e então é abatida. No método natural, é preciso um ano para que o fígado das aves atinja o mesmo tamanho para o abate, o que acontece pouco antes da migração, no início do inverno.

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"Temos de aprender a não subestimar a natureza"

Dan Barber, chef americano

Graças à maneira como as aves de Sousa vivem em sua fazenda, o foie gras da Patería dispensa temperos ao ser servido. Quem teve a chance de experimentar a iguaria, produzida em pequena escala e vendida em lojas especializadas, garante que é possível identificar o aroma e o sabor de ervas da Espanha. Além de "temperados", os fígados das aves de Sousa são coloridos naturalmente. Ao se dar conta de que seu foie gras natural cinzento ficava em desvantagem em relação aos artificiais – amarelados por causa do milho -, ele plantou flores alaranjadas na região. Ao serem ingeridas, tingem os fígados dos gansos. O tom amarelado é sinal de qualidade. Tantos diferenciais refletem no preço do produto de Sousa. Na Europa, 70 gramas do foie gras da Patería custa em média 18 euros (R$ 42). O preço do tradicional é de 11 euros (R$ 30).

A intimidade de Sousa com as aves impressiona qualquer um. Barber passou a chamá-lo de "o encantador de gansos" ao vê-lo batendo palmas de uma forma específica para atrair um bando de gansos selvagens que migravam para o sul. Na ocasião, as aves pousaram na fazenda e por lá ficaram, graças às condições que encontraram. "Eduardo nos mostra que as escolhas mais ecológicas e éticas na produção de alimentos resultam em produtos mais saborosos", diz Barber. "Temos de aprender a não subestimar a natureza."

Fotos: Javier Soriano/AFP photo; Stan Honda