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Na terça-feira 14, o presidente da Câmara dos Deputados, Arlindo Chinaglia (PTSP), assistiu atônito ao sepultamento da reforma política. Os deputados aprovaram um projeto do líder do PR, Luciano Castro (RO), que, em tese, proíbe aos parlamentares trocar de partido, instituindo a fidelidade partidária, mas na prática tem tantas brechas que se torna a regulamentação da infidelidade. “O Congresso não quis fazer as mudanças, o que é tão democrático quanto se quisesse”, justifica Chinaglia. Para completar, na mesma semana, o presidente da Câmara viu-se instado por setores do PT, do baixo clero e pelos servidores a colocar em pauta uma proposta que na prática é um trem da alegria. “Especialmente nessa época em que nenhum voto pode ser desperdiçado para aprovar a CPMF, cede-se a todas as pressões corporativas e do baixo clero”, critica o presidente do DEM, Rodrigo Maia (RJ). O fato é que Chinaglia, que fez da reforma política o tema prioritário de sua eleição para a presidência da Câmara, vem se revelando tão inábil na condução política que, na realidade, é como se a Casa estivesse de volta aos tempos em que era presidida pelo deputado Severino Cavalcanti, autoproclamado o “rei do baixo clero”.

O projeto de fidelidade aprovado na terça, por exemplo, veta o troca-troca dos partidos, mas estabelece que um ano antes da eleição, no mês de setembro, as mudanças poderiam acontecer. “É o mesmo que dizer que o sujeito não pode roubar nem matar, a não ser em um determinado mês em que tudo ficaria permitido”, critica o presidente do PPS, Roberto Freire. Além disso, cria exceções em que a troca seria permitida que jogam a lei no terreno da subjetividade. E passa ainda por cima de uma interpretação do Tribunal Superior Eleitoral de que os mandatos dos deputados são dos partidos. O projeto anistia as trocas que aconteceram no passado. “Isso é um retrocesso. É a vitória do jeitinho”, critica o ministro Marco Aurélio Mello, do TSE e do Supremo. “Não é impossível que o STF declare esse projeto inconstitucional”, completa.

“O PODER DE DEFINIR A PAUTA É DELES (GOVERNO E PRESIDENTE DA CÂMARA), QUE TÊM A MAIORIA”
deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ)

E o que dizer do projeto de emenda constitucional que efetiva servidores públicos contratados de forma temporária que estão no cargo há dez anos? Na prática, ele permite que esses funcionários entrem no serviço público sem concurso, o que também contraria a Constituição. A estimativa é de que 60 mil pessoas seriam beneficiadas. A esse projeto pode ser adicionado um outro que efetivaria funcionários requisitados de Estados e municípios, o que aumentaria o trem da alegria em outros 200 mil lugares. Essa perspectiva assustou o próprio governo. “Isso é um precedente perigoso, e nem sei calcular o impacto que isso teria nas contas do governo”, alertou o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo.

“O governo cede às pressões, não consegue evitá-las”, critica o deputado Fernando Gabeira (PV-RJ). “A forma de votação da reforma política foi aprovada pela unanimidade dos líderes. Portanto, não foi pressão do baixo clero, mas ação do altíssimo clero”, defende-se Chinaglia. “Quanto ao projeto dos servidores, colocálo em pauta não significa aprová-lo. Nós temos que ter coragem de deliberar sobre os temas polêmicos, e não ficar empurrando-os para debaixo do tapete”, conclui.

“O que o presidente da Câmara e o governo parecem não conseguir entender é que o poder e a responsabilidade por definir a pauta é deles, que têm a maioria”, rebate Rodrigo Maia. “Não faz sentido fazer discurso de que não queriam, de que foram voto vencido e querer jogar a responsabilidade nos outros.” Ulysses Guimarães e Luís Eduardo Guimarães, que presidiram a Câmara dos Deputados em tempos menos medíocres, assinariam embaixo.