A atriz e apresentadora Fernanda Lima tem presença, charme e desenvoltura para comandar um programa ousado. "Amor & Sexo", nova atração da Rede Globo nas noites de sexta-feira, tinha tudo para ser sua consagração profissional. Mas não é, e o problema não está em Fernanda. O que se mostra estridente nessa atração que se propõe a tratar de sexo sem sisudez é a sua completa falta de espontaneidade – exatamente o que o programa diz ser sua marca. Ninguém se mostra realmente à vontade ao falar do assunto e, ao se simular uma leveza, tropeça-se nas próprias pernas. Isso ficou evidente e quase constrangedor no quadro "Strip Quiz". Nele um homem e uma mulher dão sua opinião sobre assuntos diversos. Se o auditório achar que é mentira, o participante perde uma peça de roupa – não sua, claro, a coisa é só simbólica. Seria uma brincadeira de criança não fossem as intervenções. No programa de estreia, ao responder a pergunta "Tamanho é documento?", a atriz Claudia Raia, saiu-se com uma negativa e revelou um pouco de sua experiênacia. Um comentário desnecessário.

A dificuldade de se falar abertamente sobre sexo é que o limite entre o tom espirituoso e a vulgaridade é muito tênue. O cantor Léo Jaime, à frente de uma banda durante toda a atração, é também chamado a opinar nos debates. Caiu na armadilha de confundir o tom. "Vocês estão discutindo o tamanho dos pés, mas não discutiram o dos sapatos", disse ele. Para compensar as saias-justas, fica de plantão uma sexóloga, a psiquiatra e professora da USP Carmita Abdo. Ela entrou em ação quando um espectador telefonou perguntando se gostar de carícias nas nádegas é uma tendência homossexual. Carmita ajudou Fernanda a precisar o que é ser gay e a questão de ser apalpado serviu de mote para o casal de repórteres Valéria e Fábio Gonçalves sair à rua numa enquete. Os entrevistadores vivem juntos há mais de meio século e têm, respectivamente, 69 e 78 anos. A idade poderia significar que se vive mesmo em tempos menos caretas. Mas o expediente não funciona e só reforça o riso amarelo.

Nos anos 1970, o filósofo francês Michel Foucault escreveu três livros sobre a história da sexualidade, estudada da Grécia antiga ao século XX, defendendo a tese de que, em nossa época, as pessoas discorrem tanto sobre sexo porque esse falatório funciona como uma forma de controle social da própria sexualidade. Na mesma época, outro grande pensador, o cineasta italiano Pier Paolo Pasolini, dizia que não se vive uma liberação sexual, mas uma permissividade – e que isso esconderia esse mesmo controle do desejo, não percebido no Carnaval liberalizante. Hoje a internet sacramentou a situação e contribuiu para banalizar a vivência do prazer. Ou seja: a ideia de que o sexo é uma coisa simples não passa de uma grande balela. O resto é apelação na briga pela audiência.