Menos de uma semana depois de o presidente Fernando Henrique Cardoso afirmar com todas as letras que a economia brasileira cresceria 3% entre janeiro e dezembro de 2001, veio a ducha de água fria. E a fonte não é nenhum “criticozinho” de plantão, para usar a última expressão cunhada por FHC para definir quem discorda de seus atos, mas os técnicos do próprio Ministério do Planejamento. O País crescerá no máximo 1,7% nesse período, informou o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), e outros 2,3% em 2002, caso as coisas não piorem ainda mais no Exterior. Para uma economia que vinha embalada e crescia a uma taxa anualizada de 4,2% no primeiro trimestre, foi uma freada e tanto. Jogou pela janela planos de investimento de empresas brasileiras e estrangeiras instaladas aqui, levou embora o lucro de muitas outras, tirou o emprego de pelo menos 600 mil pessoas e fez o consumidor pensar duas vezes antes de abrir a carteira para gastar.

“É uma taxa medíocre, muito insuficiente para um país que já está há mais de 20 anos sem crescer de forma sustentada”, avalia o economista Paulo Nogueira Batista Jr., da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo. “É decepcionante, pois esse pode ser o início de uma terceira década perdida”, diz Batista Jr., referindo-se aos 20 últimos anos em que a economia brasileira praticamente andou de lado.

O ano que seria o da virada econômica tornou-se um repeteco do vaivém que o brasileiro, infelizmente, já está acostumado a assistir. Quando a economia ameaça decolar para taxas de crescimento próximas de 5%, como aconteceu no ano passado (leia gráfico abaixo), aparece logo uma pedra daquelas no caminho. Este ano não foi diferente, e, na verdade, houve uma sequência considerável de obstáculos, desde a crise argentina até o colapso energético, passando pelo desaquecimento da economia americana e pela ameaça de recessão mundial agravada pelos atentados nos Estados Unidos.

Todos esses choques atingiram em cheio o calcanhar-de-aquiles da política econômica – a fragilidade das contas externas nacionais – e tiveram como contrapartida a disparada do dólar. Desde janeiro, subiu mais de 30%. Para tentar apagar o incêndio, o governo voltou a subir os juros, que saíram de 15,25% no início do ano para os atuais 19%, um dos mais altos do mundo e sem previsão de queda.

As consequências foram trágicas. “Um índice inferior a 4% significa que o País não cria empregos e perpetua nossa condição de muita pobreza”, diz o diretor-executivo do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), Júlio Sérgio Gomes de Almeida. A falta de dinamismo da economia brasileira começaria a ser superada de fato com uma taxa média anual de 7%. “Se o País crescesse nesse ritmo durante dez anos, o PIB simplesmente dobraria”, calcula Almeida, que prevê para 2002 um modesto salto de 2,5% a 3%.

Quem compara o desempenho nacional ao de gigantes como os Estados Unidos, o Japão e a Alemanha pode imaginar que o Brasil não está assim tão ruim na foto, como se diz. Pura ilusão estatística, rebatem os entendidos. “O mesmo ritmo de crescimento pode ser razoável para uma determinada economia e muito ruim para outra. No caso brasileiro, em que os problemas sociais são mais graves que os do japoneses e mesmo dos argentinos, é um desempenho fraco”, diz Odair Abate, economista-chefe do Lloyds Bank do Brasil. Abate acredita que o País poderá voltar a crescer de uma forma mais consistente em 2002, com a recuperação da confiança de consumidores e empresários, desde que o conflito no Afeganistão não se agrave.

A conjuntura internacional continuará complicada nos próximos meses. Números divulgados na semana passada indicam que as 30 maiores economias do mundo, a brasileira incluída, estão à beira de uma recessão, uma sincronia negativa que não se dava desde o início dos anos 80. E mesmo depois de os maiores bancos centrais terem reduzido suas taxas de juros a praticamente zero. A economia americana, por sinal, deverá crescer, de acordo com a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), 0,7% em 2002. O banho-maria, ao que tudo indica, ainda vai longe.

A lição do futebol

A safra de novos talentos no futebol está longe de ser boa. Mesmo assim, a exportação de craques brasileiros vem contribuindo para o País fechar as contas em 2001. Os mais de 600 jogadores canarinhos que, segundo a Confederação Brasileira de Futebol (CBF), deixaram o País para atuar em outras partes do mundo em 2001 renderam US$ 115 milhões aos cofres dos clubes, segundo registros do Banco Central. Os números indicam que a balança comercial brasileira no futebol é um exemplo para o resto da economia. As vendas nos nove primeiros meses do ano são quase 45% superiores às registradas no mesmo período de dois anos atrás. Os gastos com importação de craques somaram apenas US$ 4 milhões, o que dá um superávit superior a US$ 110 milhões. Se a economia seguisse o mesmo ritmo, seríamos uma potência mundial. Um detalhe: a venda de bananas, outro produto clássico brasileiro, foi quase dez vezes menor em volume.