Os amigos costumam dizer que o empresário e restaurateur Rogério Fasano vive do prazer de comandar o Fasano, um dos templos da gastronomia italiana em São Paulo, e sobrevive com o dinheiro vindo de seus outros restaurantes. A brincadeira guarda algum sentido. Após enfrentar períodos difíceis à frente de sua casa mais famosa, que culminaram com a saída do chef Luciano Boseggia, em 1999, ele deu a volta por cima ao garimpar, na Itália, o talentoso Salvatore Loi para substituir o antigo parceiro. Hoje, Rogério comanda 600 funcionários no Fasano e em outras seis casas – Gero, Gero Caffè, Parigi, Armani Caffè, Baretto e Forneria San Paolo. Até março de 2002, deverá fincar a bandeira do Gero em solo carioca, na rua Aníbal de Mendonça, em Ipanema. Nesta entrevista, Fasano fala sobre uma de suas paixões, a trufa branca, importada anualmente de Alba, na Itália, e oferecida no Fasano nos meses de novembro e dezembro. E revela os detalhes da primeira investida do grupo no setor de hotelaria.

ISTOÉ – O que as temporadas de trufas brancas representam para o Fasano?
Rogério Fasano – A oferta anual de pratos com trufas brancas de Alba, na Itália, entre o final de outubro e meados de dezembro, tornou-se uma das marcas do Fasano. A trufa é um fungo subterrâneo que cresce junto às raízes do carvalho e de algumas outras árvores. No outono europeu, ela é caçada com o auxílio de cães farejadores, colhida e vendida a US$ 4 mil o quilo, em média. Os caçadores usavam porcos. Com o tempo, eles foram trocados por cães treinados, que não têm vontade de comer as trufas. As trufas são caras porque só crescem espontaneamente, em quantidades reduzidas. Mas o esforço compensa. Elas combinam um sabor delicado com um aroma envolvente e devastador. Devo trazer 16 quilos até o final da temporada. Uma das que chegaram na última remessa pesava quase 650 gramas. Um espetáculo.

ISTOÉ – Como devem ser servidas?
Fasano – Em lâminas, cortadas na hora sobre carpaccio, ovos de galinha ou de codorna bem moles, acompanhados de polenta, ou sobre um bom risoto à parmegiana. Outro clássico é colocá-la no talharim fresco lubrificado delicadamente com manteiga. Após a temporada de trufas brancas surgem as negras, na Itália e na França. Custam cerca de US$ 700 o quilo, têm aroma menos potente, mas também são ótimas.

ISTOÉ – Como você resolveu entrar no ramo da hotelaria?
Fasano – A idéia já empolgava o meu avô Ruggero, que seguiu o caminho aberto em 1903 pelo meu bisavô Vittorio e administrou o restaurante Fasano entre 1948 e 1969, primeiro no centro antigo de São Paulo e depois na região da avenida Paulista. O Hotel Fasano será inaugurado em outubro de 2002. Vamos investir US$ 7 milhões, financiados pelo BNDES. Tenho um sócio empolgado, o João Paulo Diniz (herdeiro do Grupo Pão de Açúcar e dono dos restaurantes paulistanos Dressing e Ecco). Ele comprou 30% das ações dos meus restaurantes, ajudou a profissionalizar o grupo e aderiu com empenho à nova empreitada. Nosso hotel estará no nível dos melhores cinco estrelas atuais. A rua escolhida, a Taiarana, é uma das mais tranquilas dos Jardins. Fica próximo do Fasano, do Gero, do Armani Caffè e de uma bela rede comercial. Teremos 65 quartos. O arquiteto Isay Weinfeld, autor do projeto, criou ambientes confortáveis e elegantes. Acredito que a diária mais barata custará o equivalente a US$ 200 (cerca de R$ 510).

ISTOÉ – Você parece animado. Mas, em 1999, sentiu muito a saída do chef Luciano Boseggia. Foi difícil, não?
Fasano – Gosto demais do Luciano, um chef de talento, mas os últimos anos de nossa parceria não foram felizes. O restaurante passou a ser marcado por um certo cansaço. Isso ficou claro em 1999, quando perdemos estrelas e pontos em avaliações críticas. Ele estava envolvido em consultorias e viajava por todo o Brasil. Pensamos em montar uma sociedade num outro restaurante, mas percebemos que a saída para a recuperação do Fasano e o caminho profissional do Luciano àquela altura eram coisas diferentes. Então, ele abriu um restaurante com outros sócios e eu fui para a Itália atrás de um novo chef. Foi um acerto civilizado. Felizmente, encontrei Salvatore Loi, a pessoa que o Fasano precisava para voltar a brilhar.

ISTOÉ – Salvatore é tão bom assim?
Fasano – Dos chefs com quem trabalhei, ele é o que mais me impressionou. Salvatore é completo. Ele teve mestres maravilhosos e, até agora, não demonstrou interesse pelo marketing gratuito. Aos 39 anos, está feliz, no auge de sua capacidade profissional. Leva a cozinha do Fasano com muita classe, sem deslumbramentos.

ISTOÉ – Como o grupo cresceu tão rapidamente?
Fasano – A parceria com o João Paulo permitiu esse salto. A idéia era criar casas independentes, mas complementares. O Parigi tem o entorno certo para se comer um steak ao poivre, enquanto o Gero é o lugar ideal para um espaguete ao vôngole. No Gero, posso sentar à mesa do cliente para conversar. No Fasano, isso não é possível na maioria dos casos. O Baretto foi eleito recentemente um dos melhores bares do mundo por uma revista inglesa. Na Forneria, os sanduíches feitos com pão argentino de miga e os levados ao forno com massa de pizza foram muito bem recebidos.

ISTOÉ – Você vai a algum restaurante em São Paulo que não seja seu?
Fasano – Gosto do Antiquarius. E acho que o Fasano e todos os bons restaurantes italianos de São Paulo devem muito aos irmãos Massimo e Venanzio Ferrari (do restaurante Massimo) e ao precursor Ca’d’Oro.

ISTOÉ – Por que você misturou influências italianas e francesas no Parigi?
Fasano – Conheço bons restaurantes franceses que oferecem cinco risotos e três ou quatro massas. Por que não um restaurante italiano com um olhar sobre os clássicos franceses? Os italianos são craques nos antepastos e primeiros pratos. Os franceses são os reis dos pratos principais. Sabem usar como ninguém o forno, os temperos e as técnicas. São os senhores da elaboração. Pode ser uma união bem-sucedida. Acho, no entanto, que os franceses não fazem bons peixes exatamente porque gostam de elaborar tudo. E peixes exigem uma simplicidade quase franciscana.

ISTOÉ – Você come aquelas coisas simples que todo mundo come?
Fasano

– Sim. Acho uma beleza um feijão cozido e temperado com delicadeza. Adoro empadinhas. Nas praias do Rio, peço com naturalidade aqueles queijos assados na brasa. Minha comida predileta é peixe. Se massa não engordasse, comeria espaguete todo dia. Já encarei muito fast food. Hoje, não dá mais.