A economia mundial começa a dar sinais de recuperação. São sinais ainda tênues que podem estar sugerindo que a economia chegou ao fundo do poço. Muitos dos problemas que originaram a crise continuam preocupando. Os créditos podres continuam nos balanços dos bancos, agora garantidos (implícita ou explicitamente) pelos bancos centrais, o mercado de crédito continua restrito, os consumidores americanos continuam endividados e sofreram grande perda de riqueza devido à queda dos preços dos imóveis e das ações.

O colapso do final de 2008 e início de 2009 adicionou novas mazelas. Redução do comércio internacional, aumento da taxa de desemprego, queda dos rendimentos reais e uma verdadeira explosão da oferta monetária e dos déficits fiscais ao redor do mundo.

Eventualmente os países terão que reduzir seus déficits fiscais, via aumento de impostos, redução de gastos ou mais inflação. A pergunta é quanto da retomada da economia depende dos estímulos fiscais e monetários e quanto é sustentável sem eles e por quanto tempo os bancos centrais e os governos ainda poderão manter estes estímulos sem gerar bolhas de preços de ativos ou de commodities e pressões inflacionárias.

Ou seja, ainda que o pior da crise pareça estar para trás, os possíveis cenários para os próximos meses ou anos são variados, com enorme incerteza. A volta à queda livre do último trimestre de 2008 e primeiro trimestre de 2009 não parece estar no horizonte. Os bancos centrais já mostraram que "bancos muito grandes para falir" não serão deixados ao relento. Porém, não podemos descartar cenários de estagnação, como o vivido pela economia japonesa nos anos 1990 e início dos anos 2000, assim como cenários mais otimistas, com crescimento forte do produto nas economias desenvolvidas, como nas retomadas de recessões anteriores.

O cenário mais provável parece ser de crescimento relativamente baixo no mundo desenvolvido, devido à baixa oferta e demanda de crédito, ao elevado nível de endividamento dos consumidores, ao aumento do desemprego e à queda da renda real, o que deverá reduzir a taxa de crescimento do consumo nos próximos anos.

Concomitantemente, o mundo emergente, devido ao baixo endividamento e ao consumo em elevação, deverá apresentar taxas de crescimento relativamente mais altas, ainda que menores do que as vigentes nos últimos anos, com tendência à valorização das moedas destes países, principalmente para países exportadores de commodities, como o Brasil. Dados os elevados níveis de capacidade ociosa e o relativamente baixo crescimento da economia mundial, dificilmente a inflação será um problema, pelo menos até meados de 2010, a menos que os incentivos fiscais não sejam retirados no seu devido tempo.

Neste aspecto, o Brasil entra em clara desvantagem, pois uma parte importante dos incentivos fiscais implementados no País teve caráter permanente (aumento de salário do funcionalismo público, aumento do valor das aposentadorias e aumento do valor das transferências governamentais), que não poderá ser retirada quando a economia voltar a uma trajetória de crescimento mais sustentável. Talvez por esta razão, o governo já se prepara para tentar aprovar um aumento de impostos, com a volta da CPMF. A questão é se a retirada dos incentivos fiscais temporários – desoneração tributária de bens de consumo duráveis e insumos para a construção civil – será suficiente para evitar pressões inflacionárias já no segundo semestre de 2010, forçando o Banco Central a um novo aperto monetário.

José Márcio Camargo é professor do departamento de economia da PUC/Rio e economista da Opus Gestão de Recursos