O Brasil se surpreendeu
na semana passada com
a divulgação de um número
redondo: 10. Era a diferença porcentual projetada a favor do presidente Lula no segundo turno das eleições de outubro. A decolagem do candidato, no entanto, deveria ter sido encarada com naturalidade. Entre os 200 milhões de brasileiros, só há um único e solitário personagem em campanha presidencial neste momento, a oito meses das eleições. A bordo do Airbus oficial, controlando um pacote de R$ 18 bilhões em verbas para obras e subindo em palanques pelo País, Lula nem precisa dizer que busca a reeleição. “Vocês podem indicar outro candidato, não vou me apressar”, desafiou o presidente, em tom de blague, aos petistas reunidos na festa de 26 anos da fundação do partido. Ele sabe que em sua própria legenda, após a depuração dos dissidentes, esse outro não existe.

A confortável posição de Lula
conta com a colaboração dos partidos
de oposição, que neste momento
patinam em torno da definição de nomes. Disputas internas e, também, o cumprimento dos prazos legais que regulam prévias eleitorais e convenções partidárias têm feito com que PSDB e PMDB se mantenham, por enquanto, fora do processo. A cúpula tucana ainda não escolheu para qual lado do muro irá descer, oscilante entre o governador Geraldo Alckmin e o prefeito José Serra. Os peemedebistas só partirão com o governador Germano Rigotto ou o ex-governador Anthony Garotinho depois das prévias de 19 de março. Até o esquerdista PSOL, que terá na senadora Heloísa Helena sua candidata, vacila. Neste caso, por falta de estrutura para montar palanques nos Estados. “Lula tem, até aqui, todas as raias só para ele”, resume o senador Álvaro Dias. “Assim é fácil.”

O que interessa aos brasileiros é que o presidente, diante do vasto campo aberto
a percorrer, perdeu definitivamente o interesse pelos assuntos da administração pública. Na prática, deixou de governar. Cada vez mais é difícil encontrá-lo em seu gabinete de trabalho, no quarto andar do Planalto, em Brasília. Na sexta-feira 17,
por exemplo, ele dividiu-se no Rio Grande do Sul entre Porto Alegre, Caxias do Sul
e Flores da Cunha, participando de encontros de religiosos e desfrutando da festa
da uva. Na terça 21, começa por Juazeiro, na Bahia, um périplo por cidades populosas do Nordeste. Em Arapiraca, à sombra de bandeirinhas e envolto por correligionários, usará sua vantagem competitiva para lançar a pedra fundamental da Universidade Federal de Alagoas. No Recife, vai inaugurar – pela segunda vez, lembre-se – a ampliação do Aeroporto dos Guararapes. É, em ano de reeleição tem também reinauguração.

Neste fim de semana, espera-se a chegada de mais pesquisas. E agora já não haverá surpresas com novas dianteiras do presidente. Ele próprio tem se esforçado para conter a euforia. Em Brasília, numa conversa informal com assessores, Lula disse, segundo ISTOÉ apurou, que do jeito que vão as coisas ele poderá repetir o feito do então presidente Fernando Henrique, que se reelegeu em 1998 sem segundo turno. “Não fomos nós que instituímos a reeleição com o presidente no cargo”, diverte-se o presidente do PT, Ricardo Berzoini. É cedo para projeções de vitória em primeiro turno, mas quanto mais tempo Lula ficar sem adversários definidos, e diante de seu apetite pelo uso da máquina pública em favor da reeleição, mais breve essa possibilidade entrará nas contas políticas de 2006 – o ano em que a eleição de outubro começou muito antes do Carnaval de fevereiro.