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ESFORÇO Rehen criou neurônio (destaque) com embrionária. Lygia estuda meios de extração

WO adiamento da decisão sobre a liberação das pesquisas com células-tronco embrionárias no Brasil retardará ainda mais o desenvolvimento no País de uma área da ciência que, no mundo, encontra-se em franca efervescência. Na quarta-feira 5, depois de dois votos favoráveis à liberação, a presidente do Supremo Tribunal Federal, Ellen Gracie, anunciou a suspensão da sessão que votava o assunto após o ministro Carlos Alberto Direito pedir vistas do processo. Não há data definida para a continuidade do julgamento. O STF está julgando ação interposta pelo então procurador-geral da República Cláudio Fonteles contra o artigo 5º da Lei de Biossegurança, aprovada em 2005. Por este artigo, são permitidos os estudos com células-tronco extraídas de embriões congelados há mais de três anos. O argumento do procurador foi o de que o uso de embriões feriria o princípio constitucional do direito à vida.

As células embrionárias são objeto de estudo porque podem se transformar em qualquer tecido do corpo. É isso que as diferencia das células-tronco adultas, extraídas de fontes como a medula óssea, mas menos versáteis. O que se quer é obter diversas células a partir das embrionárias e usá-las para repor as que se encontram lesadas. E muito se caminhou neste sentido. Nos Estados Unidos, até o meio do ano terá início o primeiro estudo em ser humano do mundo para testar um tratamento feito a partir de embrionárias. Cientistas da Universidade da Califórnia e da empresa Geron analisarão a eficácia de uma terapia para lesões medulares. Em testes prévios, as células obtidas com embrionárias ajudaram na recuperação de cobaias.

Há uma profusão de trabalhos. Em vários centros internacionais de pesquisa já foram criadas células de ossos e de músculos, entre outras, usando como matéria-prima as embrionárias. Enquanto o mundo experimenta progressos, o Brasil caminha a passos lentos. Até a decisão do STF, as pesquisas continuam liberadas. Mas são poucos os que investem nas embrionárias, por causa da falta de recursos e da indefinição quanto ao futuro dos estudos por aqui. “Não posso dar dedicação total porque não sei o que acontecerá”, explica Steven Rehen, da Universidade Federal do Rio de Janeiro. O pesquisador é um dos que chegaram a estágio mais avançado de estudo. Ele foi o primeiro a criar neurônios a partir de embrionárias importadas dos EUA.

Esta necessidade de importação, aliás, é uma mostra de quanto o Brasil ainda engatinha no campo das embrionárias. Por aqui, ainda não se criou sequer o conhecimento suficiente para extrair as embrionárias. É por isso que boa parte dos poucos e obstinados cientistas que trabalham na área buscam desenvolver essa tecnologia. É o caso da geneticista Lygia Pereira, da Universidade de São Paulo. Além de investigar os métodos para retirar as células, ela trabalha para criar linhagens – uma população uniforme de células com características definidas. “Esse conhecimento é a base para termos autonomia nas pesquisas”, afirma ela, confiante em uma decisão favorável do STF.

Na Universidade Federal de Goiás, a cientista Lidia Guillo trabalha em direção semelhante. Ela estuda opções de suporte para o cultivo de linhagens de embrionárias em laboratório. Para isso, dispõe de embriões doados. “Porém, por causa das incertezas, suspendi os estudos temporariamente”, diz. No Centro de Pesquisa em Reprodução Humana Roger Abdelmassih, de São Paulo, a pesquisadora Irina Kerkis também aguarda o fim do julgamento para estudar a produção de óvulos e espermatozóides a partir de embrionárias. Como se vê, vontade de avançar não falta. Pena que a ciência brasileira tenha que amargar mais essa espera.

 

 

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