Nesta quarta-feira 21, o Banco Central brasileiro fará sua escolha de Sofia. Terá de decidir entre a própria credibilidade e o crescimento da economia neste ano. Apenas essas duas possibilidades estarão em jogo na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom). Se reduzir os juros dos atuais 16,5% para até 16% anuais, como se espera, terá optado por seguir a retórica de Henrique Meirelles e manter o conservadorismo esperado pelo mercado financeiro. Já se a taxa cair a 15,5% anuais, como pedem alguns analistas mais ligados à produção, desmentirá o próprio discurso para entregar os empregos encomendados para 2004 pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

A situação não precisava ser tão aguda logo no início do ano. A bifurcação apareceu há um mês, a partir de um pequeno deslize da diretoria do BC. Com os juros dos EUA baixíssimos, de 1% ao ano, a poupança dos americanos já inundava o mundo em busca de aplicações mais atrativas desde meados de novembro. No dia 30 de dezembro, o BC divulgou seu Relatório de Inflação, informando que seria “parcimonioso” este ano quanto à política monetária. Ou seja, os juros de 16,5% cairão lentamente, para inibir o consumo e fazer com que a inflação chegue ao final de 2004 próxima dos 5,5% fixados como meta. “Bancos centrais não se comprometem com trajetória de juros”, ensina o economista Carlos Thadeu de Freitas Gomes, um ex-diretor do BC e professor do Instituto Brasileiro do Mercado de Capitais.

O resultado do pecadilho foi estrondoso. Houve dois movimentos. Uma onda de dólares entrou no Brasil e fez desabar o seu preço.
E bilhões administrados por fundos estrangeiros correram em busca dos C-bonds brasileiros no Exterior. Em tempo: C-bonds são títulos emitidos em 1994 que vencem em 2014. Eles nasceram das moratória de 1983 e 1987. Nessas ocasiões, quebrado, o País parou de pagar a dívida externa. Na década de 90, por iniciativa do secretário do  Tesouro dos EUA, Nicolas Brady, o calote foi renegociado e os novos termos inscritos em títulos internacionais, apelidados de bradies. Quando entrou no mercado, entretanto, a fama de mau pagador do Brasil corria na veia desses papéis e os investidores pediram descontos cavalares para comprá-los. Por cada US$ 100 em títulos, pagavam-se só US$ 48. Há 15 dias, viraram motivo de cobiça e, pela primeira vez na história, negociaram-se sem nenhum desconto.

Quando o preço desses papéis aumenta, significa que o risco percebido pelos investidores em relação ao Brasil diminuiu. Há até um índice

para medi-lo. Esse índice, feito pelo banco americano JP Morgan, caiu 60% desde o ano passado e mostra um “risco” de 4%, isto é, para um investidor estrangeiro vale a pena aplicar no Brasil desde que aqui se pague 4% mais que nos EUA. Em bom português, os dólares continuarão a entrar loucamente até que o BC reduza os juros para algo próximo

de 12%, que é a soma do juro americano, do risco-país e da inflação esperada para os próximos 12 meses. Há perigo. “O excesso de liquidez está se transformando numa avalanche”, avisa Freitas. “Quando a taxa de câmbio cai muito, costuma subir muito em seguida. No Brasil, isso significa inflação.” O futuro depende da perícia do Banco Central em

sair do dilema em que se meteu.