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PRESSÃO
Sem apoio político nem credibilidade, Berlusconi anunciou sua renúncia

“Não é difícil governar a Itália. É inútil.” O ditador Benito Mussolini cunhou essa frase que tinha a pretensão de jogar sobre o povo italiano a culpa de todas as mazelas do país. A história vem mostrando, contudo, que a famosa frase embute uma verdade, só que num sentido invertido. Inúteis são governantes como Mussolini e Silvio Berlusconi, o bufão de 75 anos que foi primeiro-ministro por três vezes e agora cai por absoluta incapacidade de apresentar soluções para a brutal crise econômica da Itália. O último mandato de Berlusconi começou em 2008 e, desde então, ele parecia viver uma realidade paralela. Passou o tempo administrando denúncias – de fraude fiscal a sexo pago com belas garotas, incluindo uma marroquina de 17 anos. Mas foi a economia que acabou com sua condição de primeiro-ministro com mais tempo no poder italiano depois da Segunda Guerra Mundial. Sem respaldo político para adotar medidas de austeridade essenciais para impedir a quebradeira da Itália, a terceira maior economia da zona do euro, Berlusconi anunciou sua renúncia na terça-feira 8. Só não marcou a data. Como condicionou a saída à aprovação de um pacote de re­formas econômicas, ele acabou provocando mais incertezas quanto ao futuro da economia italiana.

No dia seguinte ao da renúncia anunciada, os títulos da Itália com validade de dez anos foram refinanciados com juros recordes de 7,48%. “Os mercados estão dizendo a Berlusconi que saia agora. Eles não compram o esquema dele de fingir sair em duas semanas”, tuitou em Nova York o economista Nouriel Roubini, o mesmo que previu a turbulência de 2008.

Enquanto o presidente da Itália, Giorgio Napolitano, garantia não haver “nenhuma dúvida” sobre a renúncia de Berlusconi, o primeiro-ministro se comparava a Benito Mussolini. Lembrou que, em carta para a amante, Clara Petacci, Mussolini confidenciou que só servia para dar sugestões e não para aprovar leis. “Eu me sinto na mesma situação”, afirmou Berlusconi ao jornal “La Stampa”. O esvaziamento de Berlusconi havia ficado evidente na cúpula do G-20 em Cannes, na França, quando a chanceler alemã, Angela Merkel, e o presidente francês, Nicolas Sarkozy, pediram mudanças rápidas para evitar um agravamento da crise. Ficou decidido que a economia da Itália seria supervisionada pelo Fundo Monetário Internacional (FMI). No âmbito interno, a posição de Berlusconi se tornou insustentável após a sessão que aprovou as contas de 2010, mas o fez perder a maioria no Parlamento. “Oito traidores”, escreveu num papel o primeiro-ministro, que acompanhou de perto a sessão, referindo-se ao quorum mínimo de 316 parlamentares. Na sexta-feira 11, o Senado aprovou as medidas de austeridade exigidas pelo FMI, abrindo caminho para a aprovação final do pacote na Câmara dos Deputados.

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EFEITO
Papandreou (acima) também caiu, devido à crise
monitorada por Sarkozy e Christine Lagarde

Berlusconi é o quarto primeiro-ministro a perder o posto por conta da crise europeia. Antes dele, renunciaram os primeiros-ministros da Irlanda, de Portugal e da Grécia. Os casos mais recentes – Grécia e Itália – levaram a diretora-presidente do FMI, a francesa Christine Lagarde, a pedir um esforço para que solucionem as crises políticas. “Clareza política leva a mais estabilidade, e meu objetivo é mais e melhor estabilidade”, afirmou Christine na quinta-feira 10, durante visita à China. No mesmo dia, os gregos anunciaram a nomeação do economista Lucas Papademos, ex-vice-presidente do Banco Central Europeu para substituir George Papandreou como primeiro-ministro. Administrador discreto e de perfil conciliador, Papademos não esperou a posse para indicar os rumos que pretende seguir. “As escolhas que nós faremos serão decisivas para o povo grego”, disse o novo primeiro-ministro. “O caminho não será fácil, mas estou convencido de que os problemas serão resolvidos mais rápido e a um custo menor, se houver união, compreensão e prudência.”

Na Itália, a situação é diferente, a começar pelo tamanho de sua economia – na zona do euro, o país só fica atrás da Alemanha e da França. Com uma dívida de 1,9 trilhão de euros, o equivalente a 121% do Produto Interno Bruto (PIB), o país precisa renegociar pelo menos 58 milhões de euros ainda este ano. No país de Berlusconi, a incerteza política também é maior. Como preparativo para a sucessão do primeiro-ministro demissionário, o presidente, Giorgio Napolitana, nomeou senador vitalício o economista Mario Monti, ex-comissário da União Europeia. Conhecido como Super-Mario por causa do sucesso obtido no enfrentamento com as empresas americanas General Electric e Microsoft, Monti reúne todas as condições de comandar um “governo técnico”, provisório, e conta com o respaldo dos principais líderes da União Europeia.

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CRISE
Protesto na Itália, a terceira maior economia da Europa

Ao saber das articulações em torno de Monti, Berlusconi definiu a opção como inevitável. Até então, ele acalentava a esperança de convocar eleições em fevereiro para a escolha do sucessor. Pelos planos, ficaria mais três meses no poder e trabalharia para eleger seu correligionário Angelino Alfano, que já foi ministro da Justiça. “Alfano seria o primeiro violino”, compara o cientista político Roberto D’Alimonte, sugerindo que, nessa possibilidade, Berlusconi continuaria mandando nos bastidores. Dono de uma fortuna avaliada em R$ 10,8 bilhões, ele deseja manter o controle político como reserva estratégica para seus embates nos tribunais. Desde março, quando a Justiça derrubou a lei que garantia imunidade ao primeiro-ministro, Berlusconi passou a responder a três processos judiciais e se tornou alvo de outras investigações. As denúncias envolvem corrupção, fraude fiscal e até indução de menor à prostituição. A última acusação é relativa a seu relacionamento com a bailarina marroquina Karima El Mahroug, a Ruby, a responsável pela popularização do termo bunga bunga, como é chamada a dança erótica que embalava as festas de Berlusconi.

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