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CATIVEIRO E VIOLÊNCIA Jaycee Lee aos 11 anos quando foi raptada por Garrido e sua mulher, Nancy (à dir.): para a polícia o casal agiu junto

Jaycee Lee Dugard é americana e tem 29 anos. Há cerca de duas décadas, mais precisamente na ensolarada manhã californiana de 10 de junho de 1991, todo os EUA queriam saber o que acontecera a ela. A então garotinha Jaycee, 11 anos, era o comovido assunto da mídia, das famílias, da polícia, das escolas, dos escritórios, dos psicólogos e dos cultos. As transmissões de jogos de futebol eram interrompidas, e lá vinham mais notícias, conjecturas apenas, sobre Jaycee Lee. Até um pronunciamento político em rede de televisão do ex-presidente George W. Bush (estáse falando da época da Guerra do Golfo) foi entrecortado por informações especulativas. O tempo foi passando, e é lei do próprio tempo que a história e a dor de uma tragédia prossigam coladas apenas nas vítimas e nos injustiçados. Assim se fez e eles foram esquecidos. A vítima, no caso, é Jaycee, raptada naquele 10 de junho. O injustiçado é o seu padrasto, Carl Probyn, acusado pela polícia de ser o sequestrador da enteada, imputação que lhe custou o casamento e lhe trouxe a execração pública.

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“Fui injustamente acusado, perdi meu casamento e minha vida. A polícia fez de mim o único suspeito e me atirou no inferno” Carl Probyn, padastro

Também é lei do tempo que ele tenha os seus acasos. Assim, na quinta-feira 27 todo os EUA queriam saber novamente o que acontecera a Jaycee Lee Dugard, só que agora pelo avesso do sumiço: ou seja, ela reapareceu. Por acaso, não mais que por acaso, a polícia suspeitou de um cidadão que distribuía folhetos religiosos acompanhado de uma mulher e duas adolescentes – desconfiou que as crianças não eram suas filhas. Na delegacia, descobriu-se que o cidadão é Phillip Garrido, vivendo em liberdade condicional após cumprir pena por estupro. O mistério de duas décadas saldou então a sua dívida com o tempo e revelou uma história de loucura. Garrido raptou Jaycee quando ela tinha 11 anos. Desde aquele dia, ela viveu escravizada num quintal oculto por muralhas e arvoredos que cercam a casa de seu algoz.

“Barbárie”, diz a polícia. “É como se todos estivessem acampando”, delira Garrido. Mais: ele é de fato o pai das duas crianças que o acompanhavam na panfletagem religiosa e a mãe dessas meninas é justamente Jaycee (as garotas, 14 anos e 11 anos, jamais foram à escola). Psicótico, numa espécie de eterno surto, Garrido disse à polícia que “fala com Deus através de uma caixa”. Finalmente, Jaycee ressurgiu e seu padrasto não mentira quando disse, há 18 anos, que vira a menina ser empurrada para dentro de um carro cinza e que tentara seguilo em vão com sua bicicleta. Mas também ele passou a ter, a partir da sexta-feira, uma dívida com a história: o que quis dizer ao relatar que Jaycee, no reencontro com a mãe, teria admitido se “sentir muito culpada pelo vínculo que teve com o sequestrador”?