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BRASILEIROS Jovens vestidos a caráter no Memorial do Imigrante, em São Paulo: futurismo retrô

Quando estão entre si, eles chamam carro de carruagem sem cavalo e televisão de teletroscópio – como o fariam os antepassados de seus avós. São os jovens seguidores dos steampunk, uma tribo contemporânea que cultua o século XIX. Não é nada fácil conceituá-los. Steampunks, movimento que começou nos Estados Unidos e tem a literatura como berço, é um estilo de vida.

A tradução livre é punks a vapor – steam, ou vapor, é um dos símbolos da revolução industrial que aconteceu a partir do século XVIII. E punk é herança do movimento literário cyberpunk, que prega um futurismo apocalíptico e underground, embora pouco lembre os ideais românticos de seus sucessores.

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A intenção é referir-se a um passado remoto, quando as máquinas a vapor eram a sensação do mundo. E a inspiração são os livros de pioneiros do gênero: os americanos Tim Powers, Kevin Wayne Jeter e James Blaylock. A obra considerada clássica é "The Difference Engine" (A máquina diferencial), de 1990, escrita por Bruce Sterling (autor do gênero cyberpunk) e William Gibson. Foi a partir de 2006 que jovens começaram a transpor costumes, modas e ambientes para o dia a dia.

Adoram, por exemplo, praticar virtudes antigas, como o cavalheirismo, o respeito, a moderação, e de usar roupas e acessórios de época nas festas que promovem. O movimento já chegou ao Brasil. Um dos criadores do Conselho Steampunk Brasileiro, o analista de sistemas Bruno Accioly, 38 anos, do Rio de Janeiro, diz que hoje eles são cerca de 400 integrantes e estão distribuídos entre Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e São Paulo.

Em cada Estado, há núcleos chamados de loja – mesma denominação dos maçons. "Como muitos amantes do gênero, o tema me encantava mesmo antes de ganhar um formato", conta Accioly, fã do escritor Júlio Verne e de suas criações extraordinárias. Esse é o tipo de literatura que eles cultuam: a que fala de um futurismo retrô.

No dia a dia, apenas alguns seguidores se paramentam como lordes. "A roupa funciona para criar um clima nos eventos", explica o especialista em tecnologia da informação Raul Cândido Ruiz, 23 anos, de São Paulo. Na estética steampunk, espartilho é quase item obrigatório no guarda-roupa das mulheres. "Misturo essa peça com uma saia longa e acessórios de época, e improviso", afirma a estudante de música Joanna Oliveira, 22 anos, que está à frente da loja do Rio Grande do Sul.

Mas atenção: reviver o passado não significa estar desconectado do presente. O grupo usa a internet para organizar os encontros – sempre em locais cercados de máquinas -, compartilhar dados históricos e até produção literária. "Damos um novo significado àquela época, seja com uma visão nostálgica, seja mais crítica", destaca Accioly. "Pensar a relação entre homem e máquina e o abuso de recursos naturais ainda faz sentido hoje."