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MUDANÇA
Segundo Patrícia, morar na Suíça deixou o seu estilo menos pontiagudo

Existem escritores que criam universos particulares, impermeáveis ao mundo externo. Ou seja: não importa em que cidade ou país estejam, suas histórias e obsessões continuarão as mesmas – e é isso que constrói um estilo particular. A autora paulista Patrícia Melo se filia a esse tipo de artista: morando atualmente em Lugano, na Suíça, ela continua fiel à sua escrita tensa e violenta. Admite, contudo, que o fato de ter diante da janela um lago de águas claras, e não mais a opressiva paisagem paulistana, trouxe algumas mudanças em sua obra. “Estou com uma liberdade maior, minha linguagem está menos pontiaguda”, disse a escritora, que passa alguns dias no seu refúgio brasileiro, um sítio na região montanhosa de São Francisco Xavier, no interior do Estado. A outra mudança é decorrente da própria maturidade literária. Depois de 17 anos se dedicando às novelas e ao romance, Patrícia se sentiu preparada para lançar o seu primeiro livro de contos, gênero conciso, de maior exigência técnica.

A obra se chama “Escrevendo no Escuro” (Rocco) e se compõe de 13 narrativas curtas sobre personagens os mais diversos: um homem que busca certificar-se de que é amado ao provocar a sua mulher com uma suposta amante, um crítico literário frustrado por não conseguir publicar sua “obra-prima de estrutura gótica” e continuar inédito aos 50 anos, duas irmãs idosas e perplexas diante da proximidade da morte, e mais algumas almas solitárias, se debatendo contra a finitude e a transitoriedade das coisas. Alinhavando esses contos suíços de “timing” preciso, existe a figura de uma escritora que se defronta justamente com a rebeldia de um personagem. Patrícia garante que nada é autobiográfico e todos os tipos aos quais dá vida são inteiramente fictícios. Caso da dona de uma editora de renome que decide publicar os livros do próprio marido e do cantor brasileiro ganhador de um Grammy que trata de um câncer em Los Angeles.

Pelo menos uma dessas histórias já estava esboçada há algum tempo, “Síndrome de Pânico”, iniciada em 1995, sobre um investigador com “colapso do circuito neurotransmissor”, uma narrativa meio noir, estilo com o qual Patrícia ficou conhecida. Ela, porém, rejeita esse rótulo de autora de um gênero só: “Não sou uma escritora policial. Trabalho a questão da morte e da finitude.” Após oito títulos publicados, ela também extrapolou a atividade de romancista: tem uma peça atualmente em cartaz em Hamburgo, na Alemanha, “Duas Mulheres e um Cadáver”, e vai criar um roteiro inédito para o novo filme de José Henrique Fonseca, atividade à qual se dedica desde os anos 1980. Casada com o regente John Neschling, que possui cidadania suíça, Patrícia só não se aventura no campo musical – nem sequer sabe a marca do piano do marido. “Não entendo nada disso”, diz. 

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