Quem pensa que a ocupação irregular
de áreas de proteção no Rio de Janeiro
é produto da pobreza teria muito o que aprender dando um passeio pelos
arredores do Itanhangá Golfe Clube, um
dos bairros mais nobres da zona oeste. Ao lado do clube há seis mansões cinematográficas – estimadas em mais de R$ 2 milhões –, coladas a um afluente do rio Itanhangá. Da piscina, cuja parede de pedra encosta no rio, o morador desfruta da vista do campo de golfe. Do outro lado, admira sua casa, com charmosa arquitetura de madeira e vidro. Seria perfeito se não fosse ilegal. A obra, na Vila do Golfe, infringe a Lei Federal 4.771 de 1965, alterada em 1989, que tornou obrigatória a faixa marginal de proteção de 30 metros entre as construções e os recursos hídricos. É apenas um exemplo de uma prática que se prolifera em áreas valiosas.

Para obedecer a lei, a mansão teria de deslocar a piscina e o deck para os fundos do terreno. Mas quem se incomoda? A responsabilidade de fiscalização é da Superintendência Estadual de Rios e Lagoas (Serla), que tem 107 processos irregulares na Procuradoria Geral do Estado para as ações de demolição. “É difícil para a Serla conter as construções, que recebem autorização da prefeitura”, lamenta a assessora jurídica Mariana Brant. O secretário municipal de Urbanismo, Alfredo Sirkis, rebate: “A Serla foge de sua responsabilidade de punir e demolir.” Quem perde é a cidade. As casas são construídas tão perto dos rios e lagoas que não há como dragar para evitar o assoreamento. As enchentes que ocorrem com as fortes chuvas de verão poderiam ser evitadas se a lei fosse cumprida. “Os rios não dão vazão”, afere o engenheiro Wilson Júnior, gerente regional da Serla. Sua equipe iniciou em 2003 uma força-tarefa para mapear irregularidades na zona oeste. “Só as casas de luxo somam 150”, contabiliza.

A situação nas ilhas da Lagoa da Tijuca é ainda mais dramática. Um rápido passeio em torno das ilhas Primeira e da Gigóia – as maiores e mais habitadas das 11 existentes – mostra que não há regras. A legislação é de 1977 e prevê a ocupação exclusiva para fins de esporte e cultura. Mas hoje vivem ali três mil pessoas em mil residências. “Até hoje, o poder público não regularizou a ocupação”, lamenta Djalma Medeiros, ex-presidente da Associação de Moradores. O que se vê são casas coladas na lagoa, sem sistema de esgoto nem água potável. Os moradores pagam o mesmo IPTU do bairro do Itanhangá e o metro quadrado do imóvel está avaliado em R$ 1 mil.

Em 2005 foi montado um grupo de estudos para regularizar as ilhas, coordenado pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente. O secretário Ayrton Xerez garante que não serão tomadas medidas drásticas. “Vamos tolerar decks, piscinas e gramados; o que não pode são casas de até três andares”, avisa, enquanto admite que a Ilha da Gigóia já beira a favelização. É a consagração dos puxadinhos de luxo.