A natação poderia crescer muito em popularidade caso tomasse emprestado do turfe o hábito da aposta. Enquanto acompanhava in loco as provas da noite de domingo no Pan, pensei que aquela gente ensandecida poderia estar com pules na mão e gritando o nome de seus competidores. Seria a euforia com esteroides. Sem falar na delícia de descer correndo entre um páreo e outro e diante da cabine gritar em bom portunhol: “Ei, carnal, pone 100 pesos em las cabezas de Felipe França e Felipe Lima, por favor” . Fica a ideia.

Se ainda não conta com as apostas, pelo menos uma característica a natação tem em comum como as corridas no jóquei: exige do frequentador uma concentração quase mediúnica para compreender o que sai de seus alto-falantes. Para entender como a coisa funciona, imagine-se comprando um ingresso no Cinemark e falando com a mocinha atrás do vidro. Agora, coloque muito, mas muito eco no ambiente. Para ficar completa a simulação, só falta a mocinha estar comoventemente resfriada. Ah, e tudo isso com o barulho da torcida ao fundo.

E que barulho. Os torcedores que foram ao Centro Aquático Scotiabank na noite de domingo não pouparam seus pulmões. Havia vários atletas mexicanos nas finais. Bastava um deles ser anunciado para que um pandemônio se iniciasse – sem muito critério, como você vai ver no parágrafo seguinte. Os nadadores locais se esforçaram, mas conquistaram só um bronzezinho, que foi comemorado pelo público como se a medalha fosse revestida com cristais Swarovski.

Donos da casa, os mexicanos pareciam não estar muito bem informados a respeito dos atletas que os representaram. Não gritaram o nome de nenhum deles. Todos eram recebidos com os berros de Mér-ri-co, Mér-ri-co, Mér-ri-co – o único nome de atleta que saiu da boca deles foi o do Cielo. Em volume, ninguém os superava, mas sobrava um espaçozinho para que outros torcedores mostrassem as suas peculiaridades. Os americanos são os que levam a hora do hino mais a sério. Cantam com a mão no peito e virados para a bandeira (depois não querem que torçam contra eles). Como sempre, os brasileiros são um show à parte. Tinha até um quarteto com roupa tipo Teletubbies (abaixo). Com coisas como essa, os brasileiros conquistaram a simpatia dos locais, que adotaram o País como sua segunda nação.

Teletubbies.JPG

 

Apesar da multidão multiétnica, a determinada altura fixei a minha atenção em um único torcedor. Ele estava de terno, exatamente na minha frente. Entre nós, havia a piscina e um aparente oceano no que diz respeito à empolgação com o desempenho dos atletas brasileiros. Em vez de acompanhar atentamente a dobradinha nos 100 m peito, o recorde pan-americano do Cielo nos 100 m livres ou a vitória espetacular no  4 x 100 m, ele parecia ter assuntos mais importantes a resolver com as pessoas, também bem vestidas, a sua volta.

Trocava sussurros ao pé do ouvido, apertos de mão protocolares, sorrisos modelados por alfaiate. Ele fazia tudo, menos olhar para o que acontecia na piscina. Apesar disso, no final de tudo, foi uma das pessoas mais festejadas no ginásio. Ser presidente do COB deve manter a gente tão ocupado que nem dá para apreciar os motivos que nos levaram a disputar a presidência, né não, doutor Carlos Arthur Nuzman? 


PS: o mais cruel de ter de ficar até muito tarde no Centro de Imprensa é aguentar os monitores transmitindo o “Fala que Eu Te Escuto” madrugada adentro