No camarote, assistindo à guerra suja travada entre o PSDB de José Serra e o PFL de Roseana Sarney, o petista Luiz Inácio Lula da Silva, no entanto, está longe de soltar rojões e esfregar as mãos de contentamento. Ele ainda está na pole position, mas seus índices de apoio nas pesquisas de opinião caíram pela segunda vez consecutiva. Mas esse não é o único problema de Lula. Ele não vive exatamente uma lua-de-mel com o seu PT. Não paira mais acima do bem e do mal entre os petistas. O desgaste na relação entre o líder e o próprio partido, que completou 22 anos em fevereiro, é evidente. Um desgaste que vem crescendo com o tempo, fermentado por sucessivas crises, geradas, muitas vezes, em torno da definição da política de alianças. O último capítulo foi neste ano, com a tentativa de casar o PT com o PL, assunto que ainda vai
render muita polêmica.

“Lula não é mais uma figura independente dentro do PT. Ele pertence a uma tendência e por isso não paira mais acima de todos”, explicou um parlamentar da esquerda petista. A irritação de Lula com o PT dobrou de intensidade a partir de dezembro de 2000, quando o senador Eduardo Suplicy (SP) anunciou que desejava disputar a indicação do partido para a candidatura a presidente da República. Pela primeira vez a liderança absoluta de Lula era contestada. Não foram poucas as tentativas de cardeais petistas de fazer Suplicy voltar atrás. Todas em vão. As prévias do domingo 17 ficaram entaladas na garganta de Lula. Apesar dos insistentes pedidos de Suplicy, Lula também se mostrou turrão ao se recusar a participar de debates com o senador.

Temor – O incômodo de participar das prévias não era por temor de uma eventual derrota para Suplicy. A vitória de Lula sempre foi tida como favas contadas. Mas havia, sim, o medo de que os filiados do PT – um contingente em torno de 800 mil pessoas – demonstrassem pelo voto o seu descontentamento com relação à estrela maior do partido. Na semana que antecedeu as prévias, temia-se até mesmo que não se atingisse o quórum – em torno de 15% dos filiados, divididos pelos Estados – para a realização das prévias, o que seria um balde de água fria na cabeça de Lula. As estimativas eram de que participariam das prévias, que custou aos cofres petistas cerca de R$ 500 mil, entre 100 mil e 150 mil filiados, um número muito inferior ao da eleição direta para presidentes nacional e estaduais do partido, no ano passado, que contou com 220 mil votantes. Outro pesadelo que rondou o quartel-general do PT foi o chamado “voto de protesto”, personificado em Suplicy. Pelos cálculos da cúpula, se o senador obtivesse até 15% dos votos, a liderança de Lula sairia do processo sem arranhões. A idéia de que
Suplicy pudese conseguir mais de 20% dos votos, no entanto, tirou o sono de muita gente. “Isso enfraqueceria a candidatura de Lula”, comentou um dirigente.

Um dos primeiros petistas a defender as prévias no ano passado, o ex-governador Cristóvam Buarque (DF), que será candidato ao Senado, diz que ficou frustrado com a forma como elas se realizaram: “Acho um erro não ter tido debate. As prévias foram tratadas de forma ambígua e isso não foi nada bom.” Mas o próprio Suplicy, depois de muito protestar, acabou adoçando o discurso dias antes das prévias. “Gostaria de ter debatido, mas respeito a sua vontade”, disse. A partir do domingo 17, com seu nome escolhido pelas bases petistas, Lula terá muitas outras batalhas internas pela frente. Uma delas já tem data marcada. Será nos dias 23 e 24 de março, quando o diretório nacional se reúne para discutir, entre outros temas espinhosos, a política de alianças. Lula fez várias exigências para ser candidato, como a formação de um amplo leque de alianças, incluindo o PL e dissidentes do PMDB. “Eu já cometi o erro de não conversar com o PMDB em 1989. Perdi por 4% dos votos quando Ulysses Guimarães terminou com 5%. Eu não tenho mais chances de fazer uma aventura irresponsável. Quero ganhar as eleições”, argumentou Lula, em entrevista ao jornal Pasquim 21, em fevereiro. “Não podemos fingir que não há nada. É evidente que há um desconforto e desencanto no PT, que é proporcional ao desrespeito à tradição democrática do partido”, opinou a senadora Heloísa Helena (AL).

Queda – Mas o seu desempenho nas pesquisas também é outro fator de preocupação. Depois de ter atingido 31% em dezembro do ano passado, e 30% em janeiro, segundo pesquisa do Instituto Datafolha, Lula caiu para 26% em fevereiro e na última aferição, em 12 de março, foi para 25% das intenções de voto. “Não estamos preocupados com essas pesquisas porque são momentâneas. Nós vamos ter nosso programa de TV em maio e aí vamos crescer, como aconteceu com Serra, que teve uma exposição de mídia muito grande”, afirmou o líder do PT na Câmara dos Deputados, João Paulo Cunha (SP). Mas outro dado acionou o sinal amarelo no comando da campanha de Lula. Pesquisa da Toledo & Associados feita na cidade de São Paulo revelou que Suplicy, com 24,9% das intenções de voto para presidente da República, tem mais apoio do que Lula, que tem 18,8%.