Sinônimo de austeridade e comedimento, o adjetivo vitoriano é um exemplo do que um bom trabalho de marketing pode fazer por um governante. A rainha Vitória, que comandou o Império Britânico de 1837 sa 1901, é amostra eloquente deste fenômeno. Dependente ao extremo do marido, o príncipe Albert – um alemão que precisou arrancar a fórceps e muita dedicação o respeito que desejava dos ingleses –, Vitória acabou entrando para a história como uma soberana de pulso forte, que conduziu o império, então em seu período mais difícil e contestado, como uma verdadeira e irresistível líder. Mas aí veio a biografia do escritor Lytton Strachey (1880-1932), que humanizou a figura assustadora da rainha. Pioneiro na elaboração de uma pesquisa mais detalhada da biografada, Strachey não se limitou a tecer as habituais loas. A atitude de reverência aos mortos, felizmente, foi abandonada em nome de um perfil mais próximo da realidade. É até sufocante nos estreitos e eternamente vigiados limites da corte britânica.

Strachey surpreendeu a sociedade britânica ao lançar, em 1921, este Rainha Vitória (Record, 382 págs., R$ 40), que sai no Brasil em tradução caprichada de Luciano Trigo. No livro não se vê a figura idealizada da soberana, mas uma mulher nem sempre segura de seus atos e profundamente avessa a modernidades que não fossem as sugeridas pelo marido. Para quem gosta de alguma pimenta, Rainha Vitória não serve. Elegante, o escritor passa sem maiores avaliações por temas como a insinuada paixão de Vitória pelo seu cavalariço escocês John Brown, após a morte de Albert, ou pelo seu secretário indiano Abdul Karim. Mas esta discrição não compromete a qualidade da obra, que ajudou a consolidar o perfil da biografia moderna.


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