Antes de o vice José Alencar (PL) avalizar a indicação de Anderson Adauto (PL) para o Ministério dos Transportes, o ex-presidente do PL da cidade mineira de Iturama Isaac da Silva trouxe a Brasília
o Dossiê Iturama, que acusava Adauto e o senador Aelton de Freitas (PL) de envolvimento com irregularidades no município. Entregou uma cópia
no gabinete do corregedor Romeu Tuma (PFL)
e outra a Alencar. Entre os cheques emitidos
pela Prefeitura de Iturama, dois – no total de
R$ 27,9 mil – foram sacados pelo próprio Freitas.
No meio da papelada do desvio da verba está também o verbo. Uma entrevista de Freitas à Rádio Pontal, na qual ele afirma ter usado dinheiro da prefeitura para tentar fazer o sucessor em 1996.
A devassa feita por uma CPI apontou que as irregularidades em Iturama ocorreram no final da gestão de Freitas. A revelação só aconteceu quatro anos depois, em 2000, quando Aelton tentou,
sem sucesso, retornar ao cargo de prefeito.

Freitas explicava aos eleitores sua aliança com o inimigo Alípio Soares (PFL). Qualificava o acordo de ruim como suco de acerola, mas amarga mesmo foi sua afirmação: “Gastamos dinheiro do povo? Gastamos.” Perguntado sobre a união com o rival, Aelton respondeu: “Vocês se lembram quanto o prefeito da época (1988) e quanto o candidato Alípio Soares gastaram na eleição? O sr. Alípio gastou mais de US$ 1 milhão do próprio bolso e o prefeito daquela época gastou mais de US$ 1 milhão com seu candidato. O sr. Alípio assumiu uma prefeitura com mais de US$ 1 milhão de dívidas.

Sabe quem pagou? Foi vocês (sic), trabalhadores (…). Em 1992, na minha campanha contra o Waltuir, o Jacaré, eu e meu pai gastamos do nosso bolso mais de US$ 1 milhão e assumimos US$ 2 milhões de dívidas que a prefeitura deixou da campanha do meu opositor. Quem pagou? O povo ituramense. Na de 1996 não foi diferente. Muitos me chamavam de ladrão e tudo mais. Vocês viram que foi inverdade. Mas gastamos dinheiro do povo? Gastamos! A ponto de eu ter que deixar a folha de pagamento dos meus funcionários após as eleições sem ser pagas (sic). Por quê? Porque acabamos, às vezes, com aquela disputa naquele momento, gastando e fazendo o que não podia.”

Por causa das fraudes denunciadas pela CPI, o senador Aelton de Freitas responde a um processo criminal e a uma ação pública em Minas Gerais. O advogado Esdras Queiroz, do PT, pede que Freitas devolva o dinheiro desviado. Mas não só ele. Também as empreiteiras CTO, Líder, Coem e a consultoria CPA. “Uma verdadeira quadrilha foi montada na Prefeitura de Iturama sob a liderança da firma CPA”, acusa Queiroz. A CPA pertence aos fiéis assessores de Adauto, Sérgio José de Souza e Rômulo Figueiredo. O ministro também foi sócio da dupla na Embrapesca que funcionava no mesmo endereço da CPA, em Belo Horizonte. A CPA, sem licitação, beliscou R$ 260 mil dos cofres de Iturama. O senador Jefferson Peres (PDT-AM) considerou graves as denúncias do Dossiê Iturama e quer Aelton se explicando no Conselho de Ética. “Mesmo sendo fatos anteriores ao mandato, as denúncias maculam o parlamentar e respingam na instituição”, diz Peres. A senadora Heloísa Helena (PT) vai no mesmo tom: “Nossa tradição é encaminhar para a Comissão de Fiscalização e Controle e para a Comissão de Ética.”

A fita, as notas frias e os cheques assinados por Aelton vão para o novo corregedor do Senado. O atual, Romeu Tuma, foge do assunto. Através de sua assessoria, disse que “não se sentia confortável” para falar sobre Aelton. Tuma indicou o chefão da Polícia Federal. Procurado por ISTOÉ, o senador Aelton confirmou a entrevista. “Ainda que eu não tenha ouvido a tal fita, sei que se trata de uma montagem grosseira”, diz ele. Quanto aos cheques para fantasmas, Aelton diz que não “tem cabimento imaginar que um prefeito tenha de checar as empresas contratadas”. A explicação mais simplória é sobre os cheques que sacou: “Em prefeitura do interior acontece de um fornecedor ou prestador de serviço não conseguir chegar na cidade no horário comercial. Então é praxe realizar o saque para efetuar pagamento em dinheiro.”

Os petistas estão à beira de um ataque de nervos com Anderson Adauto, exonerado na sexta-feira 31 para assumir o cargo na Câmara. Se depender do PT, não tem volta. O Palácio não quer tomar a iniciativa de demiti-lo, mas espera que o próprio “ligue o desconfiômetro”, conta um próximo colaborador do presidente Lula. “Já devia ter pedido o boné”, diz outro ministro. Na terça-feira 28, o líder do PT , Eduardo Suplicy (SP), funcionou como porta-voz do desconforto geral e pediu a cabeça de Adauto: “Acho importante para a tranquilidade do governo que ele se defenda sem a responsabilidade de ser ministro.” Suplicy acrescentou que Adauto só pode voltar “quando estiver com o nome limpo”. Na sexta-feira 24, dois líderes petistas que negociavam com o PMDB foram mais explícitos sobre o futuro de Adauto. “Esse tá morto”, disse o futuro líder do PT no Senado, Tião Vianna (AC), a três caciques do PMDB.