O Ministério Público Estadual e o Federal, a Polícia Federal e a Civil, a Receita Federal e, a partir de segunda-feira 3, uma CPI da Assembléia Legislativa investigam como US$ 34,4 milhões foram depositados por uma quadrilha de fiscais estaduais e auditores da Receita em contas do Discount Bank, na Suíça, conforme denúncia de ISTOÉ. A principal suspeita é de que, entre 1996 e 2000, o dinheiro era desviado para o Uruguai antes de chegar à Suíça sob a proteção do sigilo fiscal. A descoberta do esquema já custou a cabeça do fiscal Rodrigo Silveirinha Corrêa. O secretário estadual de Controle, Fernando Lopes, que ocupou a Fazenda no governo anterior, também terá de explicar na CPI por que aparece citado na fita de vídeo gravada pela direção da Light, que flagra fiscais exigindo US$ 3 milhões para cancelar multas. Até então um negócio desconhecido, também precisará de explicações de outro homem de confiança do ex-governador Garotinho, o ex-chefe do Gabinete Civil e atual secretário de Transportes da governadora Rosinha, Augusto José Ariston. Ele está na mira da bancada petista do Rio de Janeiro e do MP estadual. Durante o ano eleitoral de 1998, quando Garotinho se elegeu governador, Ariston tinha uma “procuração especial” de uma empresa off-shore (sociedade que funciona fora de seu país de origem), a uruguaia Inversora Thiells. Ele recebeu plenos poderes para operar em seu nome “em qualquer moeda e em qualquer banco ou instituição de crédito no estrangeiro”.

“Recebi um dossiê e estou estudando as ligações da Thiells com o esquema Silveirinha. Se forem comprovadas, encaminharei o caso à
CPI”, antecipa o deputado Carlos Minc, representante do PT na CPI.
Um ex-secretário do governo Garotinho disse a ISTOÉ que Ariston, quando ocupava a Casa Civil, impediu a demissão de Silveirinha da Subsecretaria de Administração Tributária após denúncias de desvios de recursos. Outro ex-integrante do alto escalão estadual reforça a versão de que Silveirinha sempre se apresentava como apadrinhado de Ariston.
A procuração recebida por Ariston para comandar a Inversora Thiells foi assinada pela uruguaia Laura Freire Fazzio, como presidente da firma. Pelo contrato, Ariston teria “as mais amplas faculdades” para cuidar
de todos os negócios da Thiells no Exterior, como comprar e vender imóveis, abrir contas, solicitar empréstimos, constituir sociedades, adquirir cotas ou ações de outras sociedades e “celebrar qualquer espécie de ato jurídico, convênio e contrato”. O contrato valeu entre
19 de dezembro de 1997 e 19 de dezembro de 1998.

Em 1998, Garotinho e Ariston estiveram no meio de um rebuliço político.
O prefeito Cesar Maia, na época adversário de Garotinho, divulgou gravações telefônicas mostrando que Garotinho propunha comprar do amigo Ariston a rádio Litoral FM por R$ 300 mil. Garotinho rebateu dizendo que representava o dono do jornal O Dia, Ary Carvalho. Segundo Ariston, seu negócio com a Thiells nada teve a ver com a política: “A Thiells precisava de um advogado decente para intermediar a compra de um imóvel comercial no Rio.” Ele conta ter sido procurado por um amigo, Homero Quintaes, que pediu sua ajuda para fechar o negócio imobiliário.
A procuração, segundo ele, era exclusivamente para comprar um imóvel
à venda pelo fundo de pensão da Vale do Rio Doce, a Valia, no centro
do Rio. “Recebi honorários como advogado, algo em torno de R$ 3 mil.
” Na procuração assinada por Ariston, ele declara como seu endereço residencial um conjunto de salas no centro do Rio, de propriedade
do empresário Amaury de Andrade. Amigo de Ariston, Andrade é dono
da Viação 1001, a maior empresa de transporte rodoviário do Rio.
Quem ocupa hoje o endereço é Ademir Cunha de Oliveira, diretor
das Barcas S/A – concessionária das barcas que ligam o Rio a Niterói, também controlada por Andrade.

Enquanto os trabalhos da CPI estadual não começam, as provas da fraude fiscal no Rio se multiplicam. Na última semana, mais um fiscal
e novas contas entraram nas investigações. As medidas já adotadas
para investigar os outros oito servidores suspeitos de integrar a rede
de corrupção serão estendidas aos novos acusados. Os primeiros depoimentos começaram a ser ouvidos na última quinta-feira, na Delegacia de Repressão ao Crime Organizado (Draco). A estratégia
de defesa de Rodrigo Silveirinha Corrêa, Carlos Alberto Ramos e Rômulo Gonçalves, que, juntos, teriam mandado para a Suíça US$ 28,8 milhões, tem sido a de negar as acusações. Em depoimento na quinta-feira
30, que durou quase cinco horas, Silveirinha se recusou a falar
sobre questões relativas à área federal, ao governo e aos inquéritos arquivados pelo MP, como o caso dos US$ 3 milhões da Light. Mas
as investigações estão apenas começando.