A julgar pelo ótimo Em nome de Deus (The Magdalene Sisters, Inglaterra/Irlanda, 2002), do escocês Peter Mullan, em cartaz no Rio de Janeiro e em São Paulo na sexta-feira 16, os ventos da liberação feminina demoraram a alcançar a Irlanda. Passada em 1964, década do exorcismo de todos os recalques, a história baseada em fatos reais revela a triste realidade dos conventos Madalena, para onde eram levadas por famílias envergonhadas mulheres pecadoras, como Margaret (Anne-Marie Duff), Bernadette (Nora-Jane Noone) e Rose (Dorothy Duffy). Obrigadas a trabalhar de graça e em condições subumanas nas lavanderias da instituição, as moças católicas não podiam sequer conversar entre si e, não raro, sofriam abusos dos curas locais. Tudo para purgar o pecado de terem sido mães solteiras ou simplesmente serem belas e sedutoras.

Em seu segundo filme, o também ator Mullan, astro de Trainspotting e Meu nome é Joe, consegue bons desempenhos de todo o elenco, especialmente da veterana Geraldine McEwan no papel da megera Irmã Bridget. Numa das cenas mais revoltantes do filme vencedor do Leão de Ouro na Mostra Internacional da Arte Cinematográfica de Veneza, de 2002, a madre obriga as garotas a ficarem nuas e a protagonizarem um humilhante “concurso de feiúra”, que lembra as crueldades mostradas em Saló ou os 120 dias de Sodoma, de Pier Paolo Pasolini. No ápice das abominações, o espectador só deseja que as moças se livrem deste inferno de açoites e orações. Fato que Mullan, cujo único pecado foi se manter muito preso ao calor das denúncias, logo providencia. Felizmente longe do sentimentalismo habitual.


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