Além do honesto uísque escocês e do legítimo charuto cubano, o carioca Miro Teixeira e o gaúcho Nelson Jobim têm algo mais em comum: a verticalização. Quatro anos atrás, eles viraram a política brasileira de cabeça para baixo, estabelecendo a camisa-de-força legal que obrigava os partidos a reproduzir, nos Estados, a coligação feita para a eleição presidencial.

Agora, eles voltam a dançar a mesma música: no final da tarde da quinta-feira 26, o deputado federal Miro Teixeira (PDT-RJ) fez chegar ao presidente do Supremo Tribunal Federal, Nelson Jobim, já recolhido à sua residência, um mandado de segurança com pedido de liminar para manter a verticalização na eleição de 2006. Numa salada oportunista, que botou o presidente Lula e o oposicionista PFL contra uma aliança entre PSDB e PT, a Câmara dos Deputados derrubou por 343 contra 143 votos a regra que libera nos Estados uma espécie de amizade colorida entre partidos, independentemente dos acordos fechados entre as legendas em nível nacional. A decisão, que vai a segunda votação, interessa não só aos pequenos partidos, mas até ao presidente.

Mas os passos jurídicos de Miro, exímio pé-de-valsa nas gafieiras mais
renomadas da Lapa boêmia, vão produzir uma afinada contradança com as evoluções do grandalhão jurista Jobim – e devem prolongar ainda mais a agonia dos pré-candidatos. Nove meses antes da eleição de 2002, Miro acionou o TSE
para que interpretasse o artigo 17 da Constituição, que afirma que os partidos políticos precisam ter “caráter nacional”. O tribunal entendeu que o princípio
pelo qual os partidos se organizaram impedia que alianças estaduais contrariassem as coligações nacionais. A interpretação de Jobim, na época presidente do TSE,
na seqüência, instituiu a verticalização em plena campanha eleitoral, supostamente beneficiando o candidato oficial José Serra (PSDB), contra o oposicionista Lula. Agora, num sinal trocado que mostra a zoeira da política nacional, Jobim pode
não aceitar a tese de Miro. A tendência do Supremo é a de acatar qualquer
mudança aprovada por meio de emenda constitucional nas regras das alianças
para a próxima campanha.

Lula botou a mão na massa e comandou pessoalmente a operação de caça a deputados federais que propiciou a derrubada da verticalização. Ao aprovar o fim da regra, impôs ainda uma derrota aos seus adversários tucanos (José Serra e Geraldo Alckmin). Feliz com a sua vitória, o presidente sabe que não terá o PMDB oficialmente no seu palanque. Os peemedebistas terão candidato próprio a presidente. Na manhã da quarta-feira 25, por unanimidade, a Executiva Nacional confirmou as prévias para o dia 19 de março. Não há mais como recuar. O artigo 62 do estatuto do PMDB define que a convenção nacional escolhe o candidato a presidente ou apenas homologa o resultado das prévias. Este ano, com prévias, a convenção nacional apenas ratificará o vencedor: o ex-governador Anthony Garotinho ou o governador gaúcho Germano Rigotto, os dois inscritos até agora.

Fazendo política, Lula costurou acordos com o PFL e até com setores do PSDB. O Planalto ainda enquadrou o presidente nacional do PP, deputado Pedro Corrêa (PE), garantindo 20 dos 48 votos, inicialmente contrários ao fim da verticalização. As articulações envolveram também conversas com os governadores Aécio Neves (MG) e Lúcio Alcântara (CE). Juntos, eles garimparam 24 votos numa bancada de 47 deputados federais.

Empolgado com o sucesso da ação junto ao Parlamento, Lula telefonou para o deputado Eduardo Campos (PE), presidente do PSB, logo após a votação. O assunto era a chapa presidencial. Mais fragilizado no Sul, Lula quer fazer par na dança da reeleição com o ministro Nelson Jobim. Com prazo legal para sair até início de abril, Lula sonha em ver Jobim filiado ao PSB para emplacar o vice sulista que pode resolver seus problemas.