O roteiro não tem nada de singelo. Numa cidade da Flórida muito parecida com Miami, um fugitivo da Justiça se arma até os dentes para fazer o que lhe der na telha. Na pele do bandido, o jogador negocia com traficantes, presta serviço às máfias chinesa e italiana, estapeia idosos e dispara contra qualquer carro que lhe cruzar o caminho. Embalado por uma trilha sonora com clássicos dos anos 80, Grand theft auto: vice city, algo como O grande assalto de carro, foi eleito o melhor jogo de todos os tempos pelos fãs e leitores de revistas de entretenimento britânicas. Transmitida pelo canal pago MTV, a cerimônia de entrega do prêmio Joystick de Ouro monopolizou, há duas semanas, o luxuoso hotel Park Lane, de Londres.

Quarto episódio de uma série de games que vendeu 25 milhões de cópias nas versões para Playstation2, computador e XBox, a aventura na Flórida é uma combinação de contravenções, roteiro elaborado e trilha sonora escolhida a dedo. Típico entretenimento para os jovens adultos, como é conhecido o rentável filão com idade entre 20 e 35 anos, que alimenta o bilionário mercado de diversão e manteve O grande assalto como um dos campeões de venda em 2002.

Em junho deste ano, o jogo ocupou o noticiário americano, mas não por suas qualidades artísticas. Dois adolescentes, um de 14 anos e outro de 16, confessaram ter se inspirado nele para usar uma espingarda escondida em sua casa e disparar contra os carros numa das ruas do Tennessee, onde moram. A brincadeira terminou em tragédia: uma enfermeira de 45 anos morreu e uma jovem de 19 ficou ferida, com oito estilhaços de balas calibre 22 pelo corpo. Há dois meses, as famílias das vítimas entraram com uma ação contra os criadores do game, Take-Two Interactive e Rockstar Games, e incluíram no rolo a loja Wall-Mart e a distribuidora Sony. Pedem US$ 246 milhões de indenização.

Em outro episódio dramático, cinco homens e uma mulher da Califórnia também relataram aos policiais que disputavam partidas de O grande assalto antes de roubar e assaltar. Suas aventuras em 2002 e início de 2003 renderam acusações em dezenas de assaltos e cinco assassinatos. Dispensável dizer que o jogo não é passatempo para crianças. Os fãs hão de querer saber, no entanto, que a Greenleaf promete distribuir toda a série no Brasil a partir de 2004. Embora os psicanalistas insistam em dizer que as telas de tevê, do cinema e, portanto, do videogame não passam de um reflexo da violência latente na sociedade, ainda sobram questionamentos sobre a influência desse tipo de diversão no comportamento violento juvenil.

Para que não restem dúvidas de que não é apenas de tiros e sangue que sobrevive a indústria de videogame, o próprio júri do prêmio Joystick de Ouro elevou ao hall da fama o japonês Shigeru Miyamoto, um dos cérebros da Nintendo e criador de jogos memoráveis, alguns até inocentes, como a série do encanador Mario. Para este Natal, aliás, o mais cobiçado entre todos os games é Mario kart double dash para o console GameCube. Na competição de kart, o jogador pilota em 16 circuitos de corrida do mundo. Só os games de kart baseados no encanador com ascendência italiana venderam 23 milhões de cópias no planeta. Na categoria de jogos inspirados em filmes, a disputa também foi acirrada este ano. O vencedor foi O senhor dos anéis, que bateu dois concorrentes fortes, Enter the Matrix e Harry Potter e a pedra filosofal. Como no mundo do videogame o que vale é a adrenalina, um dos destaques do Joystick de Ouro foi para o jogo mais antecipado do ano, a futura sequência de
Half-life. Verdadeira novela, desta vez o game foi adiado para a primeira metade de 2004 porque parte de seu código foi surrupiado. Mistério.