A nuvem de gafanhotos que atingiu o governo de Roraima, desviando mais de R$ 230 milhões dos cofres do Estado e manteve na cadeia pública do Estado por dez dias o
ex-governador Neudo Campos, sobrevoa a capital Boa Vista. A Cooperativa Roraimense de Serviços (Cooserv), que forneceu cerca de 75% dos funcionários que trabalham na Prefeitura de Boa Vista, administrada por Teresa Jucá (PPS), foi considerada pela Justiça uma empresa de “fachada” e condenada, em segunda instância, pelo TRT por “burlar” concursos públicos.

Dos quatro mil funcionários da administração municipal, três mil são ligados à prefeitura e boa parte deles não trabalha efetivamente
para fins públicos. Testemunhas que prestaram depoimento ao
Ministério Público Estadual, que investiga o caso, admitiram ter sido contratadas pela cooperativa apenas para fazer campanha eleitoral para o grupo político apoiado pela prefeita no ano passado. Parte dos cooperados não trabalha em Boa Vista. Eles ficariam em Brasília, distante mais de quatro mil quilômetros da capital de Roraima, como é o caso da astróloga Joana Maria Caranza, contratada como assessora da Secretaria de Receita e Planejamento.

Sem fins públicos – Joana recebeu, durante 20 meses, R$ 6.500 para, com a ajuda dos astros, dar consultas à prefeita e seu grupo. A filha Tharsila, também contratada via cooperativa, recebia R$ 2,5 mil mensais e sua função era fazer os cálculos dos mapas astrais. Segundo as investigações do Ministério Público Estadual, outro que está na folha de pagamento da prefeitura via Cooserv é o personal trainer da prefeita e ex-instrutor de ginástica do ex-marido de Teresa, senador Romero Jucá (PSB). Cícero Campelo Neto recebe R$ 6 mil por mês para presidir a Fundação de Educação, Ciência e Cultura de Roraima e sua mulher, Márcia, foi contratada, também pela Cooserv, com salário de R$ 8 mil para trabalhar na máquina municipal.

A cooperativa recebeu só no ano passado mais de R$ 29 milhões da Prefeitura de Boa Vista. O tênue limite entre o público e o privado se estende aos negócios dos Jucá, conforme aponta o MP. Funcionários da TV Caburaí, que pertence ao senador, são remunerados pela prefeitura, assim como a mulher, dois filhos e um enteado de Aldo Nascimento, empregado da fazenda de Teresa. As investigações não demonstram, porém, que parte dos salários dos contratados iria parar no bolso de autoridades, como no escândalo dos gafanhotos, que pode ter desviado R$ 230 milhões dos cofres do Estado.

O MP apresentou uma ação de improbidade administrativa e denúncia criminal contra a prefeita, e o Tribunal de Contas está fazendo uma auditoria na cooperativa. Os promotores Alexandre Moreira e Luiz
Antônio Araújo argumentaram na proposta de ação encaminhada à Procuradoria-Geral de Justiça que “a conduta da prefeita Teresa
Jucá de desviar dinheiro público e mão-de-obra custeada pelo Erário municipal para fins particulares (campanha eleitoral), através de um esquema no qual tentou mascarar o desvio por intermédio de uma cooperativa de “fachada”, constitui crime de responsabilidade.” O
ex-presidente e atual representante jurídico da Cooserv, Ronaldo Paiva, negou, em declarações feitas à imprensa, que a entidade seja “de fachada” e afirmou que está recorrendo da sentença proferida pelo juiz do trabalho Alberto Carvalho em 2002.