Assistir à final de um jogo de futebol pela tevê não tem a mesma graça que ir a um estádio. Ainda mais para quem costuma ver seu time na companhia de amigos barulhentos. O paraibano Guido Lemos sabe disso. Tanto é que passou as últimas três semanas sem dormir nem comer direito para finalizar os detalhes do Torcida virtual, um programa de televisão criado para demonstrar que na tevê digital tudo pode ser diferente.

Desenvolvido pela equipe que Lemos coordena na Universidade Federal da Paraíba (UFPB), o protótipo simula um estádio de futebol. Só que é o próprio telespectador quem escolhe o ângulo de visão e o som da torcida que deseja ouvir. Com o controle remoto nas mãos, ele seleciona a cadeira onde vai se sentar, se na arquibancada do Flamengo ou na do Fluminense, por exemplo.

A grande novidade, porém, é um microfone instalado no terminal de acesso – aparelho parecido com o decodificador de tevê a cabo, que faz a transição da tevê analógica para a digital. Basta escolher a cadeira vizinha à de um amigo para ouvir pelo alto-falante da tevê tudo o que ele falar durante o jogo, mesmo que cada um esteja em uma cidade diferente. “É como ir para o campo com um rádio de pilha”, compara Lemos. Programas como o Torcida virtual, em que o telespectador tem maior interferência na programação, serão testados durante os jogos da Copa do Mundo e os desfiles de Carnaval.

Assim como ocorre na internet, a experiência de ver tevê tende a
ficar muito menos passiva. Na prática, a transmissão digital vai
além da imagem e do som com qualidade superior à de um DVD. Para demonstrar o potencial do mundo virtual, 1.300 cientistas de 22 consórcios de pesquisa formados por 79 universidades criaram protótipos que vão de um museu virtual, em que o telespectador visita a sala de exibição como se fosse um videogame, até programas de votação que tanto poderiam servir para eliminar um concorrente do Big Brother quanto para aprovar ou não um referendo como o das armas.

Para exibir suas invenções ao ministro das Comunicações, Hélio Costa, os cientistas brasileiros reuniram uma dezena de protótipos. Mostraram o Jangada, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), que transforma a tevê em um computador para navegar na internet e enviar e-mails sem sair do sofá. Ou ainda o Viva mais!, um programa de auditório feito pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) para diagnosticar pessoas com depressão a partir de cinco perguntas sobre sono, apetite e aptidão física. Todo o contato com o telespectador é feito através do controle remoto.

Saúde – “Há uma infinidade de coisas relacionadas à saúde que podemos
fazer usando a tevê digital”, diz o neurologista Renato Sabbatini, presidente
do Instituto para a Educação em Medicina e Saúde. Afinal, nove em cada dez residências espalhadas pelos 5.500 municípios do País têm pelo menos um televisor. Todos os anos, são fabricados outros dez milhões de televisores, que duram em média 14 anos.

“Sabemos fazer bons produtos, falta o governo criar uma política industrial que incentive o progresso da tevê digital”, diz Marcelo Zuffo, responsável pelo terminal de acesso, que possibilita que mesmo os aparelhos antigos entrem no mundo digital. Marcada para estrear em 7 de setembro, a tevê digital ainda deve vencer etapas difíceis, como a escolha do padrão de transmissão de imagens. Hoje há quatro disponíveis: o brasileiro, o japonês, o americano e o europeu. Em comum, eles têm a capacidade de transmitir imagens para tevês de alta definição e celulares. Além de abrir as portas para um mundo onde a imaginação é o limite.