O ímpeto e a capacidade empreendedora de Edemar Cid Ferreira são observados por diferentes ângulos no mundo cultural brasileiro. Há pelo menos uma coincidência entre todos esses olhares: trata-se de um homem que pensa grande. A característica ficou ainda mais aguçada nos últimos três anos, depois que ele criou a BrasilConnects, que visa preservar e divulgar o patrimônio cultural e ecológico do País. À frente da instituição, Cid Ferreira deixou marcas até em Pequim, na China, durante encontro sobre uma mostra de civilização chinesa em São Paulo. Ao se dar conta de que as preciosidades ocupariam apenas um andar do Pavilhão da Oca, o espaço paulistano que ele transformou em templo das artes, Cid Ferreira nem sequer pestanejou. Em vez de comemorar diante das quase 100 obras milenares cedidas para a exposição, virou para Emilio Kalil, um dos diretores da BrasilConnects, e redefiniu metas:

– É muito pouco. Vamos dar um jeito de ter o tamanho que merecemos. Precisamos mostrar aos chineses o tamanho da Oca, o tamanho de São Paulo, a grandeza do Brasil.

Catorze meses depois, em fevereiro deste ano, quatro aviões de carga desembarcaram na capital paulista 22 toneladas em obras de arte, seguradas em US$ 127 milhões. Entre as 450 relíquias exibidas na megaexposição Guerreiros de Xi’an e os Tesouros da Cidade Proibida estavam 11 soldados e dois cavalos de terracota, em tamanho natural, com quase dois mil anos de existência. É o maior número de obras de terracota do Exército do imperador chinês Qing Shi Huang já exposto fora da China. Para conseguir a façanha, nenhum esforço foi poupado. Nesses 14 meses, apenas Kalil viajou sete vezes à China. No mesmo período, Cid Ferreira convidou e recebeu nesse lado do mundo duas delegações chinesas. “Eles ficaram absolutamente alucinados com o Brasil”, comenta. Durante a primeira megaexposição que promoveu, a Mostra do Descobrimento, em 2000, ele já havia adotado a estratégia, apresentando o País para 600 convidados estrangeiros. Como reflexo desse intercâmbio, em 2004 obras brasileiras estarão expostas no Museu da Cidade Proibida, em Pequim; no Museu do Vaticano, em Roma; no Museu de Arte Moderna de Tóquio e até no pavilhão de convenções de Davos, na Suíça, durante o Fórum Econômico Mundial.

Para comemorar os 450 anos da cidade de São Paulo, a Oca vai apresentar a maior exposição já realizada na América Latina da obra do espanhol Pablo Picasso. Serão 131 obras de diferentes fases do artista, entre pinturas, esculturas, trabalhos em cerâmica e sobre papel. Os números contabilizados pela BrasilConnects são sempre fabulosos. As 46 exposições já organizadas pela instituição – 23 no estrangeiro, em museus como o Guggenheim, de Nova York, e o Jeu de Paume, de Paris – receberam oito milhões de visitantes. Aos 60 anos, Cid Ferreira está cada vez mais empenhado em romper fronteiras através das artes. Instalado na elegantíssima sede de seu banco, o Santos, ele conta que o vínculo com a cultura se estabeleceu por causa de sua mãe, Marina, grande apreciadora de ópera e pintora.

A trajetória particular como grande colecionador de arte, por sua vez, começou quase ao acaso, após ganhar uma coleção de moedas antigas no aniversário de 12 anos. Na esteira do interesse pela numismática, Cid Ferreira comprou, oito anos depois, um Ficão, como é conhecido um certificado de depósito que circulava pelo antigo Arraial do Tejuco (MG) no final do século XVIII. “O Ficão me levou para outros documentos históricos brasileiros, que desaguaram em registros internacionais”, enumera. “Para ilustrar esses documentos tinha sempre um bico-de-pena, uma foto, o que me levou a montar uma das mais importantes coleções de fotografias do País.” Ele convive com essas obras o tempo todo. Para se ter uma idéia da integração, basta lembrar que há fotografias de nus femininos em todos os banheiros do Banco Santos.

Objetos de arte também estão espalhados por toda a casa de Cid Ferreira. Sua mulher, a engenheira civil Márcia, diz que já perdeu
a conta das vezes em que, só após ver pregos na parede, soube
que determinadas obras haviam sido emprestadas para exposições.
Filha do senador Alexandre Costa, já falecido, Márcia conheceu Cid Ferreira no altar da Catedral da Sé, em São Luís (MA), em fevereiro de 1976. Os dois foram padrinhos de casamento de sua amiga de infância Roseana Sarney e Jorge Murad. “A Roseana nem conhecia o Cid direito. Ele era amigo do senador José Sarney”, lembra Márcia, dando gostosas risadas. Dois anos depois, foi a vez de Roseana e Jorge Murad testemunharem o casamento de Márcia e Cid Ferreira. Por causa do marido, Márcia passou a conhecer arte mais profundamente. Ao se definir, no entanto, o próprio Cid Ferreira garante ser essencialmente um homem de negócios. “A cultura é um abre-alas. A gente vem atrás fazendo negócio. E o meu negócio é abrir as portas para o Brasil no Exterior”, diz. Tudo indica que está no caminho certo. O Brasil nunca teve tanta visibilidade no circuito internacional das artes.