O fim de ano promete ser amargo para o presidente Lula, sem presentes, sem comemorações com champanhe. A dez dias do Natal e 16 do réveillon, levou um balde de água gelada na cabeça: com sua queda de popularidade, os adversários ganharam força e sua reeleição ficou mais distante do que nunca, segundo pesquisas de intenção de voto para presidente, divulgadas na quinta-feira 15. A denúncia do mensalão decepou cabeças poderosas do Planalto. A bomba explodiu há seis meses, mas só agora atingiu em cheio o presidente pessoalmente. Decepou boa parte de seu carisma e principalmente aquilo que qualquer político mais busca: votos. O maior fantasma de Lula é o tucano José Serra, que bateu as asas e o ultrapassou. É o que mostram pesquisas do Ibope, por encomenda da Confederação Nacional da Indústria (CNI), e do DataFolha. Pela primeira vez, as aferições mostram que o prefeito de São Paulo revidaria a derrota sofrida no segundo turno de 2002 já no primeiro round da eleição de outubro de 2006, caso ela ocorresse hoje.

Dança dos números – O cenário não deixa dúvidas: a segunda disputa para presidente com direito a reeleição da história do Brasil será dançada em ritmo frenético, ao som da crise política tocada incansavelmente há seis meses. A dança dos números nas pesquisas de opinião a dez meses e meio da batalha pelo Planalto mostra também que, ao perder fôlego, Lula deu gás a outros nomes. Além de Serra, o também tucano governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, o ex-governador Anthony Garotinho, do PMDB (que pela primeira vez bate na casa dos 20% das intenções de voto, segundo pesquisa CNI/Ibope), e até a senadora do PSOL Heloísa Helena (AL).

No Brasil, onde os governantes têm quatro anos de mandato, o terceiro ano é tido como o melhor: tradicionalmente é o início da colheita dos projetos plantados a duras penas por administradores desde o primeiro dia. No primeiro e no segundo anos, o chefe do Executivo começa a conhecer a máquina e esquentar os motores. Foi assim com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), que assumiu o primeiro mandato em 1995. Há oito anos, em dezembro de 1997, FHC preparava-se para conquistar no ano seguinte o feito de ser o primeiro presidente reeleito no país. Embora enfrentasse a sua crise – um furacão na economia internacional que atingiu o Brasil –, o tucano planava tranqüilo pelas pesquisas de opinião que lhe davam uma dianteira de 12 a 15 pontos porcentuais acima de seu concorrente mais forte, o petista Lula, que perdeu no primeiro turno.

Tudo indica que a oposição continuará jogando álcool na fogueira das denúncias no ano eleitoral: a pesquisa CNI/Ibope revelou que na mente dos brasileiros estão registradas notícias ruins: a acusação de que o PT dava “mesada” para deputados foi a mais citada (20%), seguida do tema denúncias de corrupção nos Correios e em outros órgãos governamentais (17%) e a cassação de José Dirceu (14%). Menina-dos-olhos de Lula, o programa de transferência de renda Bolsa-Família foi citado apenas por 2%.

A melancolia do presidente não é à toa. O petista termina o seu terceiro ano com a colheita fraca. E tem pouco tempo para virar o jogo. O mau humor do brasileiro começou a piorar a partir de junho, com a eclosão do escândalo. As pesquisas mostraram que a população desaprova as ações do governo no combate à fome, ao desemprego, rejeita as altas taxas de juros e não está satisfeita com a atuação do Planalto na segurança pública, na saúde e na educação. Do ponto de vista pessoal, Lula também está caindo no conceito do eleitor. A confiança no presidente – que chegava a 76% em junho de 2003, segundo pesquisa CNI/Ibope, caiu para 43%.

Derrota – A pole position de Serra não é pouca coisa. Se a eleição fosse hoje, Lula perderia em todas as camadas sociais da pirâmide brasileira, inclusive na sua imensa base: justamente onde está a massa beneficiada com o Bolsa-Família, que hoje atinge 8,7 milhões de famílias. O tucano venceria o petista no interior do País, nas periferias das grandes cidades e nos pequenos municípios – justamente onde o governo consegue colher a sua melhor avaliação. Além disso, Serra está mais bem cotado em todas as regiões, com exceção do Nordeste. Lula ainda perde no primeiro turno para Alckmin no Sudeste. O governador mostrou que não é tão insosso como um “picolé de chuchu”: deu um arranque que o fez ficar tecnicamente empatado com Lula no segundo turno, segundo a pesquisa CNI/Ibope. Em entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura, na segunda-feira 12, Alckmin ironizou os políticos abençoados pelo carisma. “Os tais carismáticos perderam a eleição e o chuchu aqui teve milhões de votos.”

As pesquisas caíram como uma bomba sobre o Planalto, animaram a oposição e provocaram um rebuliço em todos os partidos. Os ânimos dentro do PT e do PSDB estão mais acirrados. Os petistas irritaram o Planalto ao aprovar um documento com ataques à política econômica, demonstrando que Lula perdeu a hegemonia sobre seu partido. O PT vai tentar aprovar um programa de governo mais ousado na economia do que o presidente acredita que pode ir. Enquanto isso, os tucanos Serra e Alckmin afiam seus bicos na guerra que escolherá o candidato a presidente do PSDB. No mesmo dia em que Alckmin era o entrevistado do Roda Viva, Serra falou ao eleitorado numa entrevista à rádio CBN. Como está numa saia-justa por ter jurado a seus eleitores, em 2004, que não abandonaria o comando da cidade antes do fim do mandato, em 2008, Serra não assumiu que sonha com o Planalto de novo. Foi político ao afirmar, no ar, que concordava que o “ideal” é permanecer na prefeitura, como havia prometido na campanha. Depois, o prefeito se arrependeu e pediu para que essa frase não chegasse aos ouvintes.