Quando completou 24 anos, em 7 de novembro de 1976, Geraldo Alckmin Filho estava angustiado. Ele sonhava ser médico, cursava o quinto ano de medicina, era vereador em Pindamonhangaba e na semana seguinte disputaria a eleição para prefeito da cidade. Logo pela manhã, recebeu um bilhete de seu pai. A mensagem manuscrita dizia: “Estás intranquilo. Olhe, aconteça o que acontecer em tua vida interior ou no mundo que te rodeia, nunca te esqueças de que a importância dos acontecimentos ou das pessoas é muito relativa. Calma… Deixa correr o tempo e depois, olhando de longe e sem paixão os fatos e as pessoas, adquirirás a perspectiva. Darás a cada coisa o seu lugar, de acordo com o seu verdadeiro tamanho. Se assim o fizerdes serás mais justo e evitarás muitas preocupações. Que Deus te faça imensamente feliz. Com todo amor, as bênçãos do papai.” Hoje, aos 51 anos, casado e pai de três filhos, o médico anestesiologista Alckmin ocupa o principal gabinete do imponente Palácio dos Bandeirantes, sede do governo paulista. Comanda o segundo maior orçamento do País e a 15ª economia mais competitiva do mundo, à frente de países como Itália, Argentina e Rússia. Em sua carteira, ainda carrega o bilhete recebido há 27 anos e se emociona cada vez que o lê. “Perdi minha mãe com nove anos e quem mais influenciou minha vida foi meu pai”, diz. A mensagem transmitida no bilhete explica o jeito Alckmin de governar, sempre com a razão à frente da emoção.

Portador de um currículo vitorioso – vereador, prefeito, deputado estadual, duas vezes deputado federal, vice-governador e governador –, Alckmin é um político diferente. Ele não se destacou no movimento estudantil, não foi líder comunitário, jamais se dedicou ao sindicalismo e a militância partidária sempre se deu paralela ao desempenho dos cargos conquistados pelo voto. Na verdade, Alckmin entrou na vida pública por acaso. Tinha 19 anos e cursava o primeiro ano da Faculdade de Medicina da Universidade de Taubaté quando recebeu a visita do presidente do MDB de Pindamonhangaba, Paulo de Andrade. O objetivo do líder partidário era filiar ao partido um outro aluno da faculdade chamado Antônio José Betônio Moreira. Alckmin estava ao lado de Betônio e acabou também se filiando. Meses mais tarde, Betônio desistiu de concorrer a uma cadeira na Câmara Municipal e restou ao MDB lançar a candidatura de Alckmin, que saiu da eleição como o vereador mais votado na história da cidade. Somou 1.447 votos, mais de 10% do eleitorado. “Para ajudar a pagar a faculdade, dava aulas em um curso supletivo e tinha alunos de todas as fábricas que estavam instaladas na cidade. Esses alunos fizeram a minha campanha”, explica o governador.

Mesmo ocupando a presidência da Câmara, Alckmin não pretendia disputar a eleição para prefeito em 1976, embora o partido
insistisse em sua candidatura. Em agosto, o ex-presidente
Juscelino Kubitschek morrera vítima de um acidente na Dutra,
rodovia que margeia Pindamonhangaba. A revista Manchete publicou
uma edição especial sobre a vida do presidente que construiu Brasília. Alckmin estava de plantão no hospital e em um dos intervalos leu a revista toda. “Fiquei emocionado com a história e com a obra do Juscelino. Saí do plantão disposto a encarar a eleição”, disse. A partir daí, a política virou meta. Em 1986, Alckmin foi o quarto mais votado entre os deputados federais eleitos pelo PMDB e, na Constituinte, se tornou vice-líder do partido comandado por Mário Covas. Dois anos depois, foi um dos fundadores do PSDB. Em 1990 se reelegeu e de 1991 a 1994 dirigiu os tucanos paulistas e organizou o partido em todo o Estado. Em 1994, elegeu-se vice-governador na chapa de Mário Covas e foi reeleito em 1998. Em 2000 perdeu a eleição para prefeito da capital, mas em março do ano seguinte, com a morte de Covas, assumiu o governo paulista. Em 2002 foi eleito governador.

“Nosso desafio é gerar emprego e renda. Não temos os controles macroeconômicos, mas estamos pisando no acelerador. Incentivamos os pólos de desenvolvimento regional, reduzimos a carga tributária e fecharemos o ano com déficit público zero”, promete o governador. “O Brasil vai voltar a crescer e São Paulo está pronto para disparar”, diz.

Discípulo de Franco Montoro, Alckmin é um radical defensor das parcerias, seja entre os executivos federal, estadual e municipal, seja com a iniciativa privada. Uma prática nem sempre confortável para um governador, pois não são raros os casos em que prefeitos oferecem um brejo e exigem do Estado a construção de um conjunto habitacional, com água, luz e saneamento básico. Como bom filho do interior paulista, nesses casos Alckmin recorre àquelas histórias de caipiras. Com paciência e discurso pausado, ele conta ao prefeito que em Pindamonhangaba havia um alfaiate muito bom chamado Pascoal. Um dia, Pascoal ficou doente e quem o socorreu foi dr. Lessa, um médico que também era banqueiro com fama de não dar ponto sem nó. Após a consulta, Pascoal disse ao médico: “Doutor, eu não posso lhe pagar, mas estou às suas ordens. Quando precisar de uma costura ou de pregar um botão, disponha.” No dia seguinte, o médico mandou ao alfaiate um envelope com um botão e um pedaço de papel onde estava escrito: “Peço que você pregue um terno nesse botão.” E, contando essa história, Alckmin consegue dizer não sem ganhar antipatia.

Casado com Maria Lúcia, pai de Sophia, 24 anos, Geraldo, 22, e Thomaz, 20, apesar dos 32 anos de vida pública, Alckmin consegue manter sua vida privada fora da mídia. Nos raros momentos de folga, o governador evita se expor. No domingo 7, abriu uma exceção. Trajando camiseta pólo, boné e tênis, Alckmin e dona Lú, como é conhecida a primeira-dama, participaram de uma sessão de LienChi – técnica chinesa de relaxamento – no parque Villa-Lobos. “Isso melhora a qualidade de vida”, afirmou. O governador não esconde de ninguém que prefere o Executivo ao Legislativo, mas, quando perguntado sobre seu futuro político, responde inspirado no bilhete que recebeu do pai em 1976: “O futuro trará a sua própria aflição”, conclui.