14/12/2005 - 10:00
O estilista paulistano Alexandre Herchcovitch, 35 anos, filho de classe média de um engenheiro e de uma dona-de-casa, descobriu aos 13 anos que gostava de corte e costura. Dava palpites nas roupas da mãe, inventava modelos e assim ganhou do pai a sua primeira máquina de costura. Em poucos meses a sala do apartamento da família Herchcovitch transformou-se em seu primeiro ateliê. Daí em diante, Alexandre se tornou uma espécie de Rei Midas do mundo fashion. Tudo o que toca vira ouro – fama e dinheiro para ele. No início da década de 90, em sintonia com o circuito underground paulistano, criou modelos espalhafatosos para amigos drag queens. Costurou para prostitutas e travestis e ganhou uma fiel clientela. O grande vôo estava dado. Atualmente, Alexandre Herchcovitch, a grife, já tem showroom em São Paulo, Nova York, Paris e Londres e está incluída no calendário dos mais badalados circuitos de moda internacional. As imagens de caveiras que ele tanto ama e colecionava na infância, estampando-as em camisetas na adolescência, foram incorporadas para uma série de porcelanas da Tok&Stok. A marca Alexandre Herchcovitch passeia, entre outros produtos, por movéis, pratos, celulares e linhas de cama, mesa e banho. E, quem diria, estará até nos novos uniformes dos 34 mil funcionários da maior rede mundial de fast-food: Alexandre Herchcovitch vestirá o McDonald’s.
Trabalho, trabalho, trabalho. O sucesso é conseqüência de eu fazer aquilo que gosto.
Se eu não trabalhasse tanto e com tanto prazer, eu não teria conseguido realizar tantas coisas. E o sucesso foi muito rápido. Em 12 anos consegui fazer muitas coisas que eu tinha vontade. A primeira delas foi
construir uma marca.
Eu me interessei em aprender a costurar e cortar com 13 anos. Cursei moda e me formei com 21 anos. Quando eu saí da faculdade era consumido por um público underground de São Paulo. Fazia roupas para amigos que trabalhavam na noite. Criei roupas para drag queens, travestis e prostitutas. E fiz uma clientela. Minha mãe, que eu adoro, cortou roupas para travestis e drag queens.
Eu lembro exatamente. Eu vendia cada vestido por US$ 100.
Juntava dinheiro e ia para Nova York, comprava tecido que não tinha aqui, como couro sintético, vinil, pelúcias zebradas e de onça. Ganhava mais dinheiro e ia de novo para Nova York.
Era na casa onde eu vivia com meus pais. As drags iam até lá para tirar as medidas. Fiz todas as roupas de um desfile de drag queens e depois levei a minha mãe para assistir ao show delas. Ela adorou. Eu tinha clientes também no mundo artístico e da moda. Eram dois mundos opostos, mas a arte se inspira muito nos movimentos marginais.
Eu me defino como criador. Porque aí fica no ar: criador do quê? Eu trabalho com idéia e criação para a casa e para o corpo.
A minha mãe toma conta de toda a produção. Meu irmão cuida da parte administrativa e financeira e meu pai não trabalha diretamente, mas ajuda intelectualmente em algumas decisões.
Se levarmos em conta o clima do País, a cultura e o culto ao corpo, eu acho que o brasileiro se veste bem. Eu trocaria a definição “se veste bem” pela expressão “se veste de uma maneira livre”.
Eles se escondem nas roupas, usam roupas dois números maiores do que o corpo deles. Ombros enormes, mangas largas, calças com muitas pregas.
O Brasil de dez anos para cá abriu os olhos para a moda. Não é mais um assunto raro na mídia. O estilista mudou com o seu tempo e hoje estilista é do meu jeito, de diversos jeitos.
Um pouco mais próximo do seu público e do seu cliente. Não é aquela coisa do estilista inatingível, caríssimo. O Brasil noticia tanta moda hoje em dia que acho que o assunto só perde para o futebol. As minhas clipagens mensais (quantidade de artigos na mídia) são avaliadas em três, quatro milhões de reais. É muito o que se paga.
Numa linha de comida. Não tem nada a ver com o meu trabalho.
Não posso dizer que sou DJ. Eu fui convidado uma vez para tocar numa festa junto com o Jhonny Luxo, que é meu amigo. E ele é DJ profissional. Nós tocamos e foi tanto o sucesso que a boate fez uma noite fixa. Mas eu sempre toco com o Jhonny porque não sei mexer no equipamento. Decidimos quais as músicas que vamos colocar e eu vou guardando CDs e dando CDs para ele. Não sei mixar. DJ tem de saber o lado técnico e tem de ter feeling para saber a música certa que o povo quer ouvir. A minha contribuição é esse feeling.
O meu cachê para dar uma palestra como estilista oscila entre R$ 8 mil e R$ 15 mil. Como DJ, vai até R$ 5 mil. Quando eu viajo perco um dia e meio de trabalho aqui no escritório. Isso tem de valer dinheiro.
Eu tenho 14 tatuagens. Essa na minha mão esquerda é uma espécie de agenda onde anoto recados. A vida inteira eu escrevi na mão esquerda coisas que não podia esquecer. Eu podia continuar escrevendo na mão sem a tatuagem, mas fiz porque esse hábito é muito marcante em mim.
Uma maneira diferenciada de interferir num produto. Na Tok&Stok tem uma linha de porcelana em que a estampa está embaixo do prato. É uma marca minha. A estampa é muito elaborada, mas está escondida. Se você pegar uma roupa e olhá-la por dentro e por fora, ou vir o tipo de corte, vai perceber algum detalhe que subverte a ordem. Acho que é o traço comum em todos os meus trabalhos: uma intervenção que subverte um pouco a ordem.
Muito mais no passado do que agora. Hoje sou menos revolucionário. Antes, eu não tinha nenhuma preocupação comercial com a
marca. Nem de me tornar uma grande marca. Hoje, a grife está estabilizada no mercado, tem seu público. No começo a minha moda foi muito mais revolucionária do que é hoje.
Eu não recebo críticas por fazer sucesso no Brasil. Mas acho
que as pessoas pensam que eu ganho muito mais dinheiro do que de fato ganho. Isso é bom: significa que elas acham que eu valho mais do que eu estou valendo.
É muito bom ganhar dinheiro. Não me envergonho disso.
As oportunidades foram surgindo. Algumas empresas perceberam que além de eu criar roupa eu poderia desenvolver outros produtos que não fossem do vestuário, como roupa de cama e linha casa. Fazer uma roupa é muito mais complicado do que fazer um objeto para casa. A roupa tem de atender a diversas medidas. Você faz uma calça tamanho 38 para vestir diversos corpos diferentes que são tamanho 38. É uma matemática que se tem de ter e só se adquire com a experiência. Fazer um sofá ou uma porcelana é menos complicado. Um prato é um prato. Você cria um design diferente, põe uma estampa e escolhe uma cor que julgue que as pessoas vão gostar.
Não. Eu não economizo naquilo que gosto.
Comida. Não tenho um prato especial, mas gosto de comer bem.
Somente a camiseta.
O lado da subversão, quando se tem de trabalhar em cima de um briefing, é muito menor. Eu posso dizer que uma boa subversão que fiz
foi criar os uniformes dos funcionários do McDonald’s. Era impénsável que um dia eles atenderiam de jeans. Subversão não é só fazer a coisa mais louca. Às vezes é isso: colocar os atendentes do McDonald’s, que sempre vestiram roupa social, de calça jeans.
A roupa dos atendentes será muito parecida com a roupa do cliente do McDonald’s. Eles vão trabalhar de camiseta pólo, calça jeans, tênis e boné. Pode não parecer subversão, mas foi dentro do universo do McDonald’s.
Não. Foi irresistível. É óbvio que eu ia aceitar. Uma roupa que 34 mil funcionários vão usar e milhões de pessoas vão ver!
Eu adoro.
Nunca ninguém me criticou diretamente por eu estar popularizando
a moda. Pelo menos ninguém teve a coragem de falar isso para mim. Mas tenho certeza absoluta de que muitos gostariam de falar. Tem gente que acha que eu
estou louco.
E como faz. Pelo amor de Deus, né? Já tenho 35 anos! Vou adorar sempre que eu fizer uma participação em novela.
Eu tive uma fala só. Era uma frase de sete palavras. Eu ensaiei no avião. Se ensaiasse mais eu ia esquecer.
Levar as coisas a sério. Tudo é uma diversão. Não dá para levar nada muito a sério. A não ser cronogramas e horários.
Levar as coisas a sério. Tudo é uma diversão. Não dá para levar nada muito a sério. A não ser cronogramas e horários.
É isso aí.
Adoraria desenhar azulejos.