A lei da natureza é rígida: só sobrevivem os fortes e eficientes. O mesmo acontece na selva política. Sair vivo e com a cabeça erguida é uma façanha para poucos no Brasil, ainda mais neste atribulado ano de 2005. José Geraldo Rodrigues Alckmin Filho, 53 anos, é de poucas palavras. Assim, ele concentrou-se mesmo em mostrar serviço no comando de São Paulo, um Estado com proporções de um país: concentra 34% do PIB nacional e acolhe 22% da população brasileira. Fala mansa, ele repete há anos que na política é preciso “amassar barro”, “comer poeira” e “arregaçar as mangas”. Frases que explicam seu sucesso em 33 anos de vida pública. “Não sou de gritaria. Quem tem argumentos para defender suas idéias não precisa gritar”, diz o governador, casado há 26 anos com Maria Lúcia, a Lu, pai de Sophia, 25 anos, Geraldo, 24, e Thomaz, 22. É também avô coruja de Isabela, um ano e quatro meses, filha do caçula, que o visita no gabinete do Palácio dos Bandeirantes a cada dois dias: “Sou do clube dos avoeiros. É uma delícia ser avô. Ela é doce, um mel, e ainda puxou a beleza da avó”, derrete-se.

Pupilo de Mário Covas, admirador de Franco Montoro e de Juscelino Kubitschek, Geraldo Alckmin dá sua definição de política: “É gostar de gente. Não é atividade tecnocrática. Não é apenas uma luta pela tomada do poder.” E cita dois “cacoetes” que normalmente vê nos políticos. “Um é falar demais. O outro é não aceitar críticas, levá-las como ofensa pessoal”, opina, obviamente, sem citar exemplos concretos que possam ter lhe inspirado para citar os cacoetes. Paulista de Pindamonhangaba, o tucano de fato nunca foi de piar muito. Não precisou fazer isso. Sua gestão tem falado por ele. As pesquisas constatam que mais de 80% da população aprovou sua gestão, que misturou ingredientes amargos, como austeridade nos gastos, e doces, como crescimento de investimento e redução de impostos. Acabou conseguindo aumentar a arrecadação tributária com a queda da sonegação fiscal. Outra equação delicada foi mesclar controle de contas com crescimento econômico: no ano passado, quando o Brasil cresceu 4,9%, e a média mundial foi de 5,1%, São Paulo cresceu 7,6%. Quando era vice do extrovertido governador Covas (morto em março de 2001), o discreto Alckmin trabalhava muito, mas passava despercebido. Esse médico anestesista, porém, operou e comandou o processo de desestatização de São Paulo, espinha dorsal do projeto de saneamento das finanças.

Os frutos dessa colheita iniciada em 1995 espalham-se hoje para todos os ramos de ação do Estado, que no ano que vem terá R$ 9 bilhões para investimentos. “Estamos fazendo cerca de 800 obras de todos os tipos”, comemora. Um de seus xodós é a ampliação do metrô. Com a melhoria da malha ferroviária urbana, Alckmin já anuncia o início de uma parceria com a prefeitura da capital paulista, liderada pelo tucano José Serra: a integração dos trilhos com os ônibus. Suas obras – como o aprofundamento da calha do rio Tietê, para evitar enchentes – já receberam visitantes ilustres, como o primeiro-ministro do Japão, Junichiro Koizumi. Mas de nada adiantaria percorrer a via-crúcis do ajuste de contas sem saber fazer uso do dinheiro. Reeleito governador em 2002, Alckmin mostrou habilidade e resume o seu conceito de ética: “Um governo não é ético se não é eficiente. Não basta não roubar e não deixar roubar. Todo mundo sabe gastar dinheiro público, mas para cortar gastos supérfluos o governante tem que ficar em cima, liderar esse trabalho. Melhorar a qualidade dos gastos é tarefa que exige enorme empenho do governante.” E exemplifica: “Economizamos até agora mais de R$ 3 bilhões com as compras eletrônicas”, diz, referindo-se à Bolsa Eletrônica de Compras. Mas Alckmin já teve que amassar muito barro, engolir muita poeira. Em 2001, com Covas doente, ele encarou a megarrebelião simultânea de 29 penitenciárias em todo o Estado, liderada pelo Primeiro Comando da Capital, o PCC, organização criminosa hoje desarticulada. Também comemora a queda de 29% no número de homicídios, de 1999 a 2004. As rebeliões da Febem ainda são uma pedra em seu caminho. Mas vêm diminuindo com a substituição das grandes unidades pelas pequenas, espalhadas pelo Estado, como fez no sistema carcerário, com a demolição do Carandiru.

O governador passou a viajar mais para fora do País também, sempre acompanhado de um séquito de empresários. Em março, teve a honra de tocar o sino que inicia os trabalhos da Bolsa de Valores de Nova York. Em novembro, esteve em Israel e na Índia. Na selva política, ninguém escapa das más línguas. Há alguns anos, seu jeito de bom moço lhe rendeu o apelido de “picolé de chuchu”. E houve quem acrescentasse: “Light.” Durante entrevista a ISTOÉ, ele mesmo puxou o assunto. “Eu gostei até. Gosto de coisa bem humorada”, disse. “E gosto de chuchu também”, riu. Sempre com expressão serena – protegido em seu gabinete pela estátua de Nossa Senhora Aparecida –, o governador, hoje pré-candidato a presidente da República, se autodefine: “Na realidade, isso se chama serenidade. Eu sou médico anestesista. Imagina num momento de stress, durante uma cirurgia, se eu fosse ficar descabelado? Tem que ter serenidade para tomar decisões acertadas e rápidas.” O filósofo italiano Carlo Mazzantini definia serenidade como “suprema potência”. Num recado aos adversários, Alckmin mostra a potência de sua serenidade: “Não tenho medo de cara feia.”


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