Desde junho, um grupo de apaixonados por insetos comanda uma pesquisa insólita na fazenda experimental da Universidade de Brasília (UnB). Os cientistas do Instituto de Biologia analisam o comportamento das moscas, dos besouros e das larvas que costumam infestar os cadáveres em decomposição. A partir do desenvolvimento desses bichos, eles identificam rastros que podem ser cruciais para desvendar certos crimes violentos.

“Pelo tipo de inseto e pela idade das larvas, é possível calcular com certa precisão a data do falecimento”, explica José Roberto Pujol Luz, professor titular de zoologia da UnB. Os insetos também são úteis para elucidar pendengas jurídicas. Dia desses, uma árvore tombou, feriu um pedestre e o laboratório de Pujol Luz foi chamado a investigar o caso. O que se queria saber era se a árvore caiu porque estava podre ou porque foi corroída por inseto. A partir da análise da larva do besouro, descobriu-se que o bicho se alimentou da árvore quando ela estava viva. Portanto, a culpa do tombo da árvore era do besouro, e não do dono da casa de onde o tronco despencou. A informação bastaria para a companhia de seguros definir quem deveria pagar a indenização pelo acidente.

Esse ramo de estudo, cujo nome técnico é entomologia forense,
algumas vezes pode determinar a causa da morte. Se a pessoa ingeriu cocaína, heroína, ou qualquer outra droga, as larvas depositadas no cadáver estarão repletas dessas substâncias. O mais pitoresco ocorre em caso de envenenamento por um raticida conhecido como chumbinho. Ao contrário de qualquer outro ser vivo, o organismo de quem tomou esse veneno não terá insetos em sua volta. “A entomologia ajuda a juntar as peças do quebra-cabeça, mas não dá as respostas conclusivas”, pondera o professor.

Para acelerar seus estudos, os cientistas resolveram fazer uma experiência com suínos porque os bichos que procuram sua
carcaça são os mesmos que aparecem nos humanos. Depois de
consultar o departamento ético da UnB, eles sacrificaram três porcos
em intervalos de uma semana. Para simular uma morte violenta, dispararam um tiro na cabeça de cada animal. Dias depois, quando
os insetos já pairavam sobre os cadáveres, cada esqueleto foi
coberto com uma gaiola de tela e armadilhas para capturar os insetos. Coletaram-se 12 mil moscas varejeiras, as mais populares entre os
papa-defuntos. Elas são o principal alvo da pesquisa, porque passam
por três fases antes de ganhar asas: ovo, larva e casulo. Ao compreender esses intervalos, os especialistas conseguem calcular o período de permanência das moscas no cadáver.

Embora a experiência seja digna de causar calafrios, ela já atrai a atenção da Polícia. Agora, o professor e sua equipe aguardam a assinatura de um prometido convênio com o Ministério da Justiça. “Precisamos de R$ 125 mil para comprar estufas, lupas, microscópios e outros materiais”, diz. O projeto de pesquisa no laboratório, aliás, começou porque os biólogos foram procurados pela polícia criminalística para auxiliar em algumas investigações. “Para nossa sorte, só chegam aqui os insetos, não fazemos idéia de que tipo de crime eles podem denunciar”, conta Pujol Luz.