Um assalto com um quê cinematográfico, mas muito fácil de ser realizado. A polícia tenta ligar os fios soltos da investigação do roubo ao banco Itaú da avenida Paulista, em São Paulo, centro financeiro do País. Sem serem incomodados, 12 bandidos passaram quase dez horas na agência, entre o sábado 27 e o domingo 28, para surrupiar 170 cofres particulares localizados no subsolo do local. Em apenas três deles, obtiveram cerca de R$ 10 milhões em joias e dinheiro, indicativo de que a ação pode rivalizar em lucro e audácia com o roubo do Banco Central de Fortaleza, ocorrido de 2006, quando foram levados R$ 164 milhões. A estimativa é de que o assalto da avenida Paulista tenha rendido mais de R$ 100 milhões.

Os seguranças da empresa de vigilância que presta serviço ao banco informaram à polícia que os alarmes da agência não foram acionados, inclusive o específico da sala dos cofres particulares, pois os dispositivos estavam em manutenção. Para entrar, os criminosos furaram a parede lateral com uma britadeira e tiveram tempo suficiente para pedir um lanche a um comparsa que estava do lado de fora por meio de um sistema de rádio-escuta. Durante toda a ação, o vigilante foi obrigado a ficar sentado em uma mesa de frente à porta de entrada para despistar quem passasse pela avenida. A filmagem da câmera de entrada e saída da agência, única a registrar o ocorrido, mostrou que os ladinos usavam caixas para carregar as joias. Peças de menor valor foram deixadas pelo piso da agência. A polícia considera que os ladrões já tinham informações sobre o conteúdo dos cofres particulares e funcionários estão sob suspeita.

ISTOÉ apurou que na lista dos clientes roubados estão os nomes da apresentadora Hebe Camargo e do jurista Ives Gandra, além do deputado federal e ex-governador Paulo Maluf (PP-SP) e de um alto funcionário do consulado do Chile em São Paulo. Procurada, a assessoria de Hebe negou que ela possuísse um cofre particular na agência. Já Gandra limitou-se a dizer que está “resolvendo o assunto com o banco”. Maluf não respondeu à reportagem. Outros dois empresários confirmaram, sob anonimato, a perda somada de R$ 12 milhões em joias e em moeda estrangeira, que é acondicionada em envelope fechado a vácuo e em notas sequenciadas de alto valor. Havia, ainda, clientes que guardavam documentos de comprovação de patrimônio, como portfólios de ações de mercado. Segundo especialistas em segurança, as peças de alto valor são retiradas do Brasil por países como Paraguai, Argentina e Suriname. Os destinos mais prováveis são Leste Europeu, Rússia e China, onde há ativo submundo de receptação de joias roubadas.

Até a sexta-feira 9, apenas quatro vítimas haviam registrado queixa no 78º DP. Uma delas afirmou ter perdido R$ 3 milhões em joias. Quem aluga um cofre particular não precisa informar o conteúdo ao banco, o que dificulta o trabalho da polícia, pois podem existir bens não declarados à Receita Federal. “Não fazemos investigação fiscal, isso é um problema da Receita. Queremos é chegar ao ladrão”, diz o diretor do Departamento de Investigações Criminais (Deic), Nelson Silveira Guimarães. Mas a razão principal da subnotificação é o medo de se expor a novas ações de criminosos. “A demanda por esse serviço de cofres em bancos está diretamente ligada ao aumento do número de invasões a apartamentos de luxo e mansões nas capitais brasileiras, principalmente em São Paulo”, diz o especialista em segurança Ricardo Chilelli. O aluguel desses cofres gira em torno de R$ 800 por semestre, mais a taxa de manutenção, que é de R$ 600.

A polícia já começou a apuração vários passos atrás da quadrilha. O assalto foi informado ao 78º DP, e não ao Deic, que tem uma delegacia especializada nesse tipo de crime e só foi comunicado uma semana depois. A demora irritou o secretário de Segurança Pública Antonio Ferreira Pinto, que promete punir os responsáveis. Diante da inépcia policial, os clientes prejudicados já contratam empresas particulares de investigação. O Itaú diz que “está atendendo de forma exclusiva e cuidadosa os impactados, que correspondem a 5% do total de cofres mantidos na agência”. O seguro padrão pago é de R$ 15 mil. Valor infinitamente menor que o prejuízo dos clientes milionários do banco.

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Colaborou Vasconcelo Quadros


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