Desde junho deste ano, uma força-tarefa da Polícia Federal, do Ministério Público e da Controladoria da União está em Boa Vista, Roraima, esmiuçando um rosário de falcatruas com o dinheiro público – uma fraude que pode chegar a
R$ 500 milhões. A operação foi batizada de “Praga do Egito”, em referência aos gafanhotos, como são conhecidos os funcionários fantasmas do Estado que vivem pendurados na folha de pagamento do governo local. O esquema funcionou entre os anos de 1998, na gestão do ex-governador
Neudo Campos, até a chegada da força-tarefa no Estado este ano. Depois do início das investigações começou a sobrar dinheiro na folha de pagamento do Estado.

Na quarta-feira 26, numa megaoperação, a polícia prendeu Neudo Campos em Brasília, sob a acusação de ser o chefe das fraudes. No mesmo dia, ele foi transferido para a cadeia pública de Boa Vista. Outros 40 foram presos em Roraima: são funcionários públicos, ex-deputados e laranjas utilizados no esquema. A trama para lesar os cofres públicos era grosseira e disseminada. Deputados (federais e estaduais), membros da cúpula do Tribunal de Contas do Estado e aliados políticos de Neudo Campos escolhiam testas-de-ferro que recrutavam pessoas comuns para receber gordos salários pagos pela Assembléia Legislativa. Os funcionários contratados não precisavam aparecer. Em troca de pequenos valores, eles assinavam procurações para que a pessoa de confiança do político recebesse em seu nome. Pelo menos 2% da população do Estado foi envolvida na falcatrua.

A campeã das procurações é Jucilene da Silva, chefe de gabinete do deputado estadual Jeiser Rener, que foi presa em Boa Vista. Ela recebia por cerca de 300 gafanhotos com salário médio de R$ 1,8 mil. A PF calcula que só através dos gafanhotos do deputado Rener foram desviados R$ 3,3 milhões. O esquema envolve 18 dos 24 deputados estaduais e dois deputados federais. Segundo o levantamento da PF, os deputados federais Alceste Almeida (PL) e Suely Campos (PFL), esposa do governador, também participavam do esquema. Tudo passava por uma empresa chamada NSAP. Essa empresa recebia o dinheiro do governo estadual e pagava os salários dos fantasmas a seus procuradores na boca do caixa. Os salários só voltaram a ser pagos por bancos oficiais – CEF e Branco do Brasil – após a chegada da força-tarefa em Boa Vista. A voracidade dos gafanhotos fez a folha de pagamento do Estado explodir em 2002. Ela atingiu R$ 6,1 milhões em junho, contra 1,9 milhão em janeiro do mesmo ano. A PF tem milhares de comprovantes de saque de salários dos fantasmas assinados por seus procuradores. Nos relatório da polícia há também menção a dois conselheiros do TCE, encarregados de fiscalizar gastos públicos. No mesmo inquérito, a PF investiga também supostos crimes eleitorais cometidos na eleição do ano passado. Muito gafanhoto ainda pode cair.