Enquanto a discussão sobre a adoção das cotas para negros nas universidades públicas gera polêmica, uma ONG, a Afrobrás, resolveu deixar a retórica e partir, sem decretos, leis ou apoio direto do governo, para ações concretas. Na sexta-feira 21, um dia depois da Consciência Negra, foi inaugurada em São Paulo a Faculdade Zumbi dos Palmares, a primeira de inclusão de afro-descendentes da América Latina. A entidade, por meio do Instituto Afro-Brasileiro de Ensino Superior, foi quem levou a cabo a idéia. A universidade reservou metade das vagas para alunos negros. “Não temos a pretensão de solucionar de vez o problema da exclusão, mas a iniciativa coloca o negro no papel de protagonista do processo. Criamos paradigmas e superamos a discussão das cotas. Fomos além”, orgulha-se o presidente da Afrobrás, José Vicente. No mesmo dia da inauguração da faculdade, o governador Geraldo Alckmin (PSDB) ofereceu, no Palácio dos Bandeirantes, um jantar a 250 personalidades para comemorar a data e homenagear o líder Zumbi dos Palmares. No evento, a Afrobrás entregou a Medalha do Mérito Cívico Afro-Brasileiro às personalidades que “trabalharam em prol da cidadania” e contribuíram de alguma forma com os projetos da ONG.

Foram agraciados representantes do Poder Judiciário, do terceiro setor, empresários e jornalistas. Cézar Peluzo e Joaquim Barbosa Gomes, ministros do Supremo Tribunal Federal, e Domingo Alzugaray, diretor-presidente da Editora Três, receberam a condecoração de Comendador Grão-Cruz das mãos do americano Joseph Beasley, secretário-geral da Raibow/Push, parceiro da Afrobrás. A professora Suzana Rangel, do Ministério da Educação, também foi homenageada. Ela prestou consultoria no projeto da Zumbi dos Palmares, que não tem fins lucrativos e será mantida por um pool de parcerias públicas e privadas, como a Fundação Instituto de Administração da Universidade de São Paulo, a IBM, a University of Rochester, da Virgínia, o The Winter Group e a Associação Brasileira de Recursos Humanos. Por conta disso, a mensalidade será bem mais barata do que a média cobrada nas escolas privadas: R$ 240 – um salário mínimo. “Formamos um mutirão social para atender à demanda pública. O critério de seleção inclui um teste para ver se o candidato está em situação socioeconômica menos favorecida”, afirma Vicente.

Serão inaugurados os cursos de administração geral e financeira, ainda em caráter experimental e com 120 vagas. Tudo na Zumbi dos Palmares será inovador, inclusive a abordagem das disciplinas. Ali, a prioridade será também a formação humanística do profissional e não só a técnica. O projeto da Faculdade Zumbi dos Palmares foi amadurecido ao longo de quatro anos, com o know how do Núcleo de Políticas Estratégicas da USP e da Universidade Metodista de Piracicaba. Hoje, a instituição conta com o apoio de dezenas de órgãos e empresas e também faz parte do programa Pererê Pererê, que visa incluir e dar visibilidade aos afro-descendentes brasileiros.
Antes de ser uma instituição dirigida a estudantes negros, a Zumbi é um instrumento inédito na luta contra a exclusão social. É um belo exemplo para os governos, que, no afã de facilitar o acesso dos mais pobres ao ensino superior, andam às voltas com projetos polêmicos, inviáveis e que não saem do campo das idéias.