A cena é comum. Quem nunca saiu
de uma consulta médica com pelo menos três recomendações básicas: não se estressar, comer de forma equilibrada e fazer exercícios físicos? Na grande maioria das vezes, as orientações ficam só no papel. Pouquíssima gente consegue de fato incorporar as sugestões na rotina. Na verdade, o que se deseja mesmo é terminar o encontro com a certeza de que se está bem e nada é preciso fazer ou, se há alguma doença, que ela seja tratada da forma mais prática e rápida possível. E sem que seja necessário mudar preferências alimentares, perder dez minutos a mais
de sono para andar um pouco ou aprender a não se irritar à toa. Isso tudo dá muito trabalho.

Essa realidade é bastante conhecida dos médicos. A cardiologista Ruth Betarello, do Hospital Samaritano, de São Paulo, já está cansada de ver pacientes ignorarem suas recomendações. “Os que seguem são minoria”, diz. Na sua opinião, é preciso maior conscientização sobre a gravidade das doenças às quais as pessoas estão expostas muito por conta de estilo de vida inadequado. É o caso dos males cardiovasculares, sabidamente associados a alimentação ruim, sedentarismo, fumo e obesidade. “As pessoas deveriam saber que essas enfermidades matam mais do que a Aids, por exemplo”, afirma.

No entanto, até mesmo quem já levou um susto daqueles, com ameaça real à vida, tem dificuldade de mudar a rotina. Um trabalho apresentado recentemente no encontro da Associação Americana de Reabilitação Pulmonar e Cardiovascular mostrou que pacientes vítimas de infarto e outros sérios problemas cardíacos não conseguiram se manter em programas de exercícios por muito tempo. De acordo com a pesquisa, feita com 83 pessoas, o número daqueles que não se exercitavam após o final do tratamento subiu de 15 para 46 depois de um ano. E a frequência daqueles que persistiram despencou: de dez sessões por mês no início para seis depois de 12 meses. A falta de adesão à atividade física também é conhecida nas academias. Na BioRitmo, de São Paulo, em média 10% dos alunos que se matriculam não voltam no segundo mês. “Eles não incorporam o exercício à rotina”, diz Paulo Cezar Poggio, coordenador geral da avaliação física. Realmente é difícil. Mesmo com excesso de peso, Pedro Mozart, 38 anos, de São Paulo, só começou de fato a malhar como manda o figurino – três vezes por semana – no início deste ano. O estímulo foi uma aula dada por personal trainer. “Antes eu achava muito chato fazer atividade física. Ficava me enganando, deixando para depois”, confessa. Já adaptado à prática de exercícios, há quatro meses Pedruando mudou seu jeito de pensar. Para isso, assistiu a palestras durante um ano adipiscing elit, sed diassssm nonummy nibh euisssssmod tincidunt ut o submeteu-se a cirurgia para redução de estômago e perdeu 25 quilos. Agora quer sumir com pelo menos mais 20 e promete continuar com os exercícios.

Diante da importância incontestável da inclusão de hábitos mais saudáveis na rotina, muitos especialistas têm se dedicado a estudar métodos para que isso aconteça de verdade. A professora de neuropsicologia Eliane Chaves, da Faculdade de Enfermagem da Universidade de São Paulo, por exemplo, coordena um ambulatório de clínica médica destinado a mudanças de comportamento nas áreas de stress e tabagismo. Uma de suas conclusões é a de que a resistência aos novos costumes não pode ser atribuída simplesmente à falta de força de vontade ou preguiça. “Muitos fatores emocionais e físicos também contam”, analisa Eliane. “Mudar significa fazer escolhas. No tratamento do stress, uma das recomendações é entender a necessidade de regular melhor o tempo. Quem trabalha dez ou 11 horas necessita colocar um limite ao trabalho e reservar algumas horas para a atividade física, o lazer e o descanso. Se não fizer isso, não vai dar certo”, diz Eliane Chaves. Além disso, há empecilhos práticos envolvidos. No caso do sedentarismo para vencer a obesidade, a própria condição física pode ser um deles ao implicar uma limitação real para execução de alguns movimentos. E existem barreiras mais inconscientes, como a necessidade de sucesso a curto prazo. “Nossa cultura é imediatista. Quem não consegue resultados logo tende a se sentir fracassado”, comenta a especialista.

A grande questão, no entanto, é por onde começar. No grupo conduzido por Eliane, a sugestão é iniciar pelo mais fácil. “Deve-se escolher um item mais razoável e fazer tudo dentro de seus limites. Se aumentar a dose irrita ou causa desconforto, continue apenas no mínimo”, afirma a enfermeira. A orientação é levada ao pé da letra. Uma de suas pacientes tinha dificuldades para inserir verduras e legumes na alimentação. “Pedi que comesse apenas uma folha de alface por dia, até sentir que já dava para comer duas”, explica.

Num primeiro momento, a conduta prioriza mais a mudança de comportamento do que a melhoria da saúde. “A intenção é introduzir
um comportamento novo, conforme a tolerância do indivíduo”, enfatiza. Esse tipo de prática é válido também para dar o primeiro passo no exercício. “A princípio, não é verdadeiro dizer que se você caminhar
vai se sentir melhor. O esforço para mobilizar energia para esse exercício não é prazeroso. Mas quando a atividade respeita os limites naturais e começam a acontecer algumas mudanças químicas e psicológicas, isso passa a proporcionar uma sensação de prazer”, explica Eliane. Daí para
a frente, ela acredita que a roda da mudança também é impulsionada
pelo aumento da auto-estima. “É a sensação de propor uma meta
viável e cumpri-la”, acredita. Em resumo, a idéia é parcelar o esforço e comemorar as pequenas vitórias. Foi o que fez a secretária Cláudia Giorgetti, 38 anos. Depois de passar mais de uma década testando regimes, ela investiu num processo a longo prazo e se matriculou no programa de emagrecimento Meta Real, que oferece um ciclo de
palestras para discutir temas relacionados com à obesidade e com duração de 52 semanas. “Fiz vários regimes, mas o emagrecimento
não se mantinha porque meus hábitos não se alteravam. Mudei quando entendi que os nossos hábitos são consequência dos padrões de pensamento que mantemos. Buscava conforto emocional na comida e comia o tempo todo”, diz Cláudia.

Adesão – Ela mantém o peso adequado há 11 anos e se tornou orientadora do programa. E também deixou de se matricular em academias, para depois não frequentá-las. “Fazia o plano de seis
meses, usava dois e os quatro ficavam por isso mesmo. Parei com
essa mania e decidi incorporar a atividade física no meu dia-a-dia.
Ando mais a pé, deixo o carro algumas esquinas antes, levo os
cachorros para passear”, conta.

No Instituto do Coração (InCor) em São Paulo, a diretriz é diferente.
Os programas priorizam mudanças maiores. “Quem começa devagar
talvez não melhore a saúde no tempo necessário. Cinco minutos de exercício não resolvem o problema de quem precisa de condicionamento físico para prevenir doenças cardíacas”, explica o fisiologista Carlos Eduardo Negrão, coordenador dos programas de mudança de hábito
do instituto. E, para aumentar a taxa de adesão, o InCor percebeu também a necessidade de trabalhar com equipes multidisciplinares, compostas de professores de educação física, cardiologistas, nutricionistas e psicólogos. “Menos de 5% das pessoas abandonam as atividades. O apoio emocional e o acompanhamento da saúde, com relatórios, aumentam a vontade de permanecer”, diz Negrão.