É peculiar o roteiro escolhido por Francisco Paula Freitas para percorrer o Rio de Janeiro, cenário e personagem de seu livro de estréia como contista. Café e Bar Ponto Chic (Bertrand Brasil, 240 págs., R$ 29) é um traçado sentimental que se estende de Copacabana ao Méier, habitado por figuras que colorem os gestos mais corriqueiros com emoções universais. O mítico espírito carioca é recuperado nestes contos, banhados em saudosismo dos bons, aquele que atualiza o que nunca deveria ter caído em desuso. Um gesto de coragem nestes tempos em que é proibido sentir saudade do que não pode voltar em forma de modismo. Em um ou outro ponto desse caminho pode-se deparar com personagens que dialogam à antiga, com menções a sirigaitas, vivaldinos e patacoadas. Volta e meia cruzamos com alguém que se chama Alcebíades ou Vavá Pirueta, nomes e apelidos comuns há algumas décadas. O melhor desse retorno é que nas 25 histórias há um jeito suave de sentir a vida, bem diferente da premência e do ceticismo dos dias atuais.

Do personagem que fica no quintal olhando as estrelas – com o
cuidado de não contá-las para que não nasçam verrugas nos dedos
– ao que espreita pela fresta da porta o velho senhor que se aproxima
do fim, no luto ou no regozijo o que sobressai é a poesia. Não fosse Freitas autor do elogiado livro de poesias Os suicidas se atiram de pés descalços, que mereceu homenagens de craques como Millôr Fernandes, Manoel de Barros e Antônio Torres. Mesmo quando descreve situações densas, o contista parece manejar a pena com um sorriso no canto da boca. Um humor carioca que serve de antídoto aos que dão excessiva importância a si mesmos, reduz os dramas e alegrias ao seu verdadeiro tamanho e confere à vida um tom de esperança que impulsiona a realizar o que vale a pena.


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