Parecido com os olhos. O significado da palavra guaraná parece incompreensível para quem só conhece o fruto em sua versão engarrafada e cheia de bolinhas de gás. No entanto, poucos têm a íris tão negra e o globo tão branco quanto a jóia vermelha da Amazônia. Na cidade de Maués, próximo à divisa do Amazonas com o Pará, estes olhos atraem uma centena de barcos apinhados de turistas quando o festival do guaraná se aproxima. Entre os dias 29 de novembro e 1º de dezembro, a 22ª edição do evento comemorou não apenas a época da colheita como contemplou o aniversário de 80 anos do guaraná Antarctica, patrocinador da festa e mais antigo refrigerante do segmento no Brasil. ?É a terceira maior festa do Estado?, explica Robério Braga, secretário de Cultura e Turismo do Amazonas. Na data, a população da cidade salta de 21 mil para 40 mil pessoas, durante 14 horas diárias de show. Artistas regionais trazem sucessos do brega e do axé e preparam a platéia para a encenação da lenda do guaraná, ponto alto da festa. Conta-se que o primeiro guaranazeiro brotou no local onde morreu Cereçaporanga, a mais bela índia da tribo sateré-mawé, e os frutos são seus olhos. A índia, uma versão tropical de Julieta, e seu amado, um membro da tribo inimiga Mundurucu, foram vitimados por um raio enviado por Tupã enquanto fugiam.

Há em Maués 6 mil hectares de lavoura do fruto, o suficiente para produzir 300 toneladas anuais de grãos torrados. ?Pelo menos 20 toneladas saem da fazenda Santa Helena?, explica o agrônomo Renato Cardoso, responsável pelos 208 mil pés da AmBev, dona das marcas Antarctica e Brahma. O restante, a empresa compra dos 1.600 pequenos produtores locais, que também fornecem matéria-prima para o suco, o sorvete, o xarope e o pó de guaraná, largamente consumidos no Norte do País. É na fazenda Santa Helena que Maria Pereira de Oliveira, 46 anos, colhe 60 quilos de guaraná por dia, o mínimo exigido pela AmBev de cada empregado. Os R$ 45 semanais não desanimam Maria, que corre para terminar a colheita mais cedo e poder visitar a festa. ?A maioria dos moradores de Maués trabalha na produção do guaraná. É onde tem emprego?, diz. De olho no turismo, o governo do Estado deve injetar no próximo ano R$ 20 milhões em cursos profissionalizantes e na infra-estrutura do município, dono das mais belas praias da região.