Os rebeldes avançam

 
Os rebeldes líbios anunciaram ter tomado o controle do quartel-general de Muammar Kadhafi em Trípoli depois de horas de combates, constatou o correspondente da AFP. Centenas de homens lançaram um ataque à residência do dirigente líbios três dias depois de entrarem na capital. Os rebeldes também anunciaram ter assumido o controle do porto petroleiro de Ras Lanuf, que fica a caminho da cidade natal de Kadhafi, Sirte. Anteriormente, o Conselho Nacional de Transição (CNT) líbio, órgão político da rebelião, afirmou estar no controle de 80% de Trípoli, em uma entrevista com a chefe da diplomacia da União Europeia, Catherine Ashton.
 
Por outro lado, Estados Unidos e França vão "manter seus esforços militares" até que "Kadhafi e seu clã" deponham as armas, afirmou nesta terça-feira Nicolas Sarkozy, após uma conversa por telefone com Barack Obama, no momento em que os insurgentes estavam prestes a se apoderar de Trípoli.
 
Os dois chefes de Estado "saudaram os progressos decisivos alcançados durante os últimos dias pelas forças do CNT (Conselho Nacional de Transição, órgão político dos rebeldes) e consideraram que o fim do regime de Kadhafi é inevitável e está próximo", segundo um comunicado da Presidência francesa.
 
O fim?
 
Diversas agências reportam que rebeldes atiram ao céu de Trípli em comemoração do avanço, que pode significar o golpe final no governo de Kadhafi, inicado em 1969 após um golpe que terminou o reinado do Rei Idris. O paradeiro do coronel é incerto, embora a agência russa Interfax tenha noticiado no início da tarde desta terça que Kadhafi permenece em Trípoli e não tem intenções de deixar o país. Nessa segunda-feira, o Pentágono também confirmou que não tem informações que Kadhafi tenha deixado a Líbia. Em coletiva concedida em Banghazi, o Conselho Nacional de Transição (CNT), órgão da liderança rebelde, garantiu que esperam encontrar Kadhafi vivo para pode submetê-lo a um julgamento.
 
Guerra de informações

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Para aumentar ainda mais a tensão no país, Seif al-Islam, influente filho de Kadhafi, reapareceu na madrugada desta terça-feira para desmentir sua prisão e reforçar a sensação de grande confusão que reina em Trípoli, controlada em sua maior parte pelos rebeldes, que proclamaram o fim da era Kadhafi. "Estou aqui para desmentir as mentiras", declarou Seif al-Islam aos jornalistas estrangeiros no perímetro de Bab al-Aziziya, o complexo residencial do pai, em referência ao anúncio de sua detenção.
 
"Trípoli esta sob nosso controle. Todo mundo pode ficar tranquilo. Tudo está bem em Trípoli", disse Seif, apresentado como sucessor e porta-voz oficioso do regime, cercado por dezenas de simpatizantes. Seif al-Islam afirmou ainda que as forças leais ao regime infligiram "elevadas perdas nessa segunda-feira aos rebeldes que assaltavam" a residência-quartel de Bab al-Aziziya.
 
O procurador do Tribunal Penal Internacional (TPI), o argentino Luis Moreno Ocampo, havia confirmado horas antes que recebera informações confidenciais segundo as quais Seif al-Islam, objeto de uma ordem de prisão da corte por crimes contra a humanidade cometidos na Líbia, havia sido detido pelos rebeldes.
 
Mas nesta terça-feira, o porta-voz do TPI afirmou que o tribunal nunca recebeu uma confirmação sobre a detenção de Seif al-Islam. "Depois do anúncio dessa segunda, nos comunicamos com o Conselho Nacional de Transição (CNT) para obter a confirmação da detenção, mas jamais recebemos por parte do CNT", declarou à AFP o porta-voz Fadi el-Abdallah.
 
O presidente do Conselho Nacional de Transição (CNT), Mustafah Abdel Jalil, também afirmara na segunda-feira ter recebido informações seguras sobre a detenção de Seif al-Islam. Mohamed Kadhafi, outro filho do ditador que também teve a prisão anunciada no domingo pelos rebeldes, conseguiu escapar, de acordo com fontes rebeldes em Benghazi.
 
Mísseis
 
Nesta terça-feira, as forças do regime de Kadhafi dispararam três mísseis Scud dos arredores de Sirte, reduto do regime, contra Misrata, cidade controlada pelos rebeldes, informou a Otan, que classificou como “irresponsável" o ato. "Os mísseis caíram na região costeira de Misrata, a princípio sem provocar vítimas nem danos", declarou a porta-voz da Otan, Oana Lungescu.
 
O enviado especial da ONU para a Líbia, Abdel Ilah Jatib, revelou que o regime líbio havia solicitado sua intervenção para negociar antes da ofensiva rebelde de sábado. "Poucos dias antes do ataque dos rebeldes contra Trípoli, autoridades líbias me solicitaram uma intervenção na ONU", declarou Jatib, ex-ministro jordaniano das Relações Exteriores ao jornal oficial Ad Destur. "Respondi que como mediador buscava o que era aceitável para o outro lado. E o outro lado se nega a negociar qualquer coisa antes da saída de Muamar Kadhafi", completou.
 
"Os rebeldes foram muito claros: não querem negociar antes de Kadhafi ir embora", disse Jatib. "Os dirigentes líbios interpretaram mal e subestimaram a posição internacional, pensando que com o tempo a revolta perderia força ou mudaria", destacou Jatib, antes de afirmar que sua missão está perto do fim.
 
Tomada da cidade
 
Os rebeldes entraram em Trípoli na noite de sábado e já controlam a Praça Verde – lugar simbólico no qual os partidários do regime costumavam se reunir – e a sede da televisão estatal, que não transmitiu sua programação diária, mas as forças leais a Kadhafi ainda resistem em alguns bairros, incluindo Tajura, Suq-Joma e Fashlom.
 
Segundo o Centro de Imprensa dos rebeldes, reforços estão chegando a Trípoli por mar a partir da cidade de Misrata, 200 km ao leste, para garantir a tomada da capital. O presidente americano, Barack Obama, e membros da União Europeia já dão como certa a queda de Kadhafi e prometeram ajudar o futuro governo líbio.
 
"O regime de Kadhafi está chegando ao fim. O futuro da Líbia está nas mãos de seu povo", declarou Obama na ilha de Martha’s Vineyard (Massachusetts, nordeste dos EUA), onde passa férias por alguns dias com a família. O presidente destacou que Muamar Kadhafi "ainda tem a possibilidade de impedir um novo banho de sangue, ao renunciar espontaneamente ao poder (…) e pedindo às forças que continuam a se enfrentar que deixem suas armas".
 
O primeiro-ministro britânico, David Cameron, afirmou que o regime líbio está em "plena retirada" e que Kadhafi deve abandonar qualquer esperança de permanecer no poder. A China anunciou que respeita a decisão do povo líbio e espera que a estabilidade retorne rapidamente à Líbia. O secretário-geral da Liga Árabe, Nabil al-Arabi, se declarou "totalmente solidário" com o governo rebelde na Líbia; e o Egito reconheceu o órgão político dos rebeldes como o governo legítimo líbio.
 
A queda de Trípoli ocorre mais de seis meses depois do início dos protestos populares contra Kadhafi no contexto da "Primavera Árabe", que já derrubou os presidentes do Egito, Hosni Mubarak, e da Tunísia, Ben Ali.