De acordo com a Organização Mundial de Saúde, a mente jamais esteve ou estará tão fragilizada como neste século. A entidade calcula que, nas próximas décadas, as doenças mentais apresentarão um crescimento assustador, em grande parte alimentado pelo desemprego, pobreza e violência. É uma perspectiva sombria, principalmente quando se sabe que esses males levam a um sofrimento difícil de ser avaliado pelos critérios puramente médicos. Além de prejudicarem o organismo, doem na alma. É o caso da depressão e da ansiedade, enfermidades que atingem 740 milhões de pessoas.

Mas, apesar da complexidade das doenças – ambas têm origem genética e podem se desenvolver a partir da interação com o ambiente –, a medicina fortalecerá o contra-ataque neste ano. No caso da depressão, o grande avanço surgirá na área de medicamentos. Espera-se que até o final de 2002 esteja disponível nos Estados Unidos a duloxetina (laboratório Eli Lilly). A droga faz parte de uma nova classe de remédios conhecidos como duais por atuarem simultaneamente sobre a serotonina e a noradrenalina. Esses neurotransmissores (substâncias que fazem a comunicação entre os neurônios) têm papel importante na depressão se estiverem em desequilíbrio. Os primeiros medicamentos criados contra a doença – os tricíclicos – também agem sobre os dois neurotransmissores, mas apresentam muitos efeitos colaterais, como a visão turva. Uma das vantagens dos duais é que eles provocam bem menos efeitos em relação aos pioneiros.

Além disso, testes mostram que a duloxetina tem ação mais rápida. Enquanto os remédios levam de duas a três semanas para começar a atuar, ela age em cerca de uma semana. “A droga será um diferencial importante contra a depressão”, afirma André Feher, diretor médico do Eli Lilly no Brasil. Outra boa notícia será a chegada por aqui do Prozac Durapac, do mesmo laboratório. É uma nova versão do antidepressivo Prozac que deve ser tomada uma vez por semana. Por isso, um de seus benefícios é facilitar a continuidade do tratamento.
Pesquisas sobre novos tratamentos também ganharão impulso. Uma delas deverá ser feita na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e terá como objeto de investigação uma técnica chamada estimulação magnética transcraniana. Desenvolvida em 1985, ela utiliza um aparelho que estimula partes do cérebro com ondas magnéticas. O procedimento provoca a liberação de substâncias que parecem melhorar o estado do paciente. “Mas o método ainda é experimental”, ressalva o psiquiatra José Alberto Del Porto, da Unifesp. Neste ano, também deve haver avanços em estudos que revelem mais sobre outros mecanismos da depressão. Cientistas querem desvendar o papel da proteína G. Trata-se de um complexo protéico existente nos neurônios que atua como um programa de computador, traduzindo as informações enviadas e coordenando as respostas a serem dadas. “O tratamento contra a depressão ainda é grosseiro. É como se batêssemos numa bola com o martelo, por meio dos remédios, mas não chegamos ao interior das células”, afirma o psiquiatra Márcio Versiani, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Daí a importância de entender melhor o que acontece dentro do neurônio.
 

Em relação à ansiedade, as previsões são igualmente promissoras. Talvez uma das mais importantes seja a ampliação do conhecimento sobre o distúrbio. Os transtornos ansiosos ainda desafiam os médicos. É comum que o paciente trate sintomas (falta de ar e dor no peito, por exemplo), imaginando que está com outro mal, como doenças cardíacas. Por isso, diagnosticar corretamente o transtorno ansioso – dividido em síndrome do pânico, ansiedade generalizada, fobias (social e específicas) e transtorno obsessivo compulsivo – é um passo fundamental. “Uma pesquisa mostrou que só 14% dos pacientes eram diagnosticados e tratados adequadamente”, diz o psiquiatra Márcio Bernik, do Hospital das Clínicas de São Paulo. Treinar um número maior de médicos a reconhecer esses males, portanto, é necessário.

Alternativas – Há boas perspectivas de tratamento a caminho. A partir deste ano, novos remédios devem chegar aos pacientes. Entre eles, estão os inibidores do CRF, um hormônio que libera a corticotropina, substância associada ao stress. O problema pode anteceder os transtornos ansiosos ou surgir por causa deles. Por isso, controlar o stress faz parte do tratamento da ansiedade. Outra solução será a ampliação do uso de antidepressivos. Explica-se. Antigamente, os médicos adotavam apenas os benzodiazepínicos, remédios que podem causar dependência. Aos poucos, os antidepressivos foram introduzidos. “Eles inibem substâncias relacionadas à ansiedade. Os mais importantes são os que agem sobre os neurotransmissores serotonina, noradrenalina e Gaba”, conta Kátia Oddone, psiquiatra da Unifesp. Alguns antidepressivos parecem funcionar melhor para tipos específicos de ansiedade. “Existe a possibilidade de adotar a bupropiona para a fobia social”, exemplifica Bernik. Ainda faltam estudos para comprovar essa aplicação.

Atualmente, Bernik garante que o melhor tratamento é a combinação de drogas e terapia comportamental cognitiva, técnica que consiste em, por exemplo, tratar o paciente por meio da exposição gradual a situações geradoras de ansiedade. E mesmo aí há esperanças. “As técnicas dessa psicoterapia estão evoluindo para tratar os problemas de modo mais específico. Dessa forma, sua eficácia aumenta”, sustenta. Como se vê, a briga contra os males que afetam a saúde mental será dura, mas boas armas surgirão ainda este ano.