A máxima de que um raio nunca cai duas vezes no mesmo lugar não se aplica ao cinegrafista Virgílio Ferro, de 31 anos. Na tarde do dia 17, ele estava no gramado de um estádio de futebol em Brusque, Santa Catarina, para cobrir o jogo entre Brusque e Avaí, pelo Campeonato Catarinense. De repente, granizos anunciaram uma forte chuva. A tempestade não demorou a alagar o campo e foi aí que um raio atingiu Virgílio e um colega, próximo dele. “Senti um formigamento no meu braço direito, voei para um lado e a minha câmera para o outro”, conta Virgílio. Formigamento, assim como cabelos arrepiados, são sensações comuns relatadas por sobreviventes de descargas elétricas. “Tomaram meu pulso e notaram que a minha mão estava travada, eu tinha dificuldade de abri-la”, diz ele, ressaltando que seu dedo direito, que apertava um botão na câmera, doeu por mais dez dias. O surpreendente é que o histórico do cinegrafista com raios não é recente. Há oito anos, ele foi atingido em uma praia. “Fiquei meio abobalhado”, lembra.

Acidentes como o de Virgílio são comuns, mas nem todos têm a mesma sorte. “A cada quatro pessoas atingidas por raios, uma morre”, afirma Osmar Pinto Júnior, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Geralmente, a morte se dá quando a pessoa é atingida diretamente pela descarga, que carboniza o corpo. Só em 2008 – ou seja, nos primeiros 56 dias do ano –, 25 pessoas morreram em virtude de descargas atmosféricas no Brasil. É um número alto, se comparado aos três primeiros meses do ano passado, quando foram registradas 18 vítimas fatais.

Esse crescimento tem uma explicação. “A culpa é da La Niña”, diz Júnior. Com ocorrência média a cada sete anos, o fenômeno meteorológico é responsável pelo resfriamento das águas do oceano Pacífico equatorial. “As temperaturas ficam mais frias, diminui a evaporação do mar e a formação de nuvens, o que altera a circulação atmosférica de todo o planeta”, explica ele. Os efeitos do La Niña são distintos em cada lugar.

No Brasil, as regiões Sudeste e Centro- Oeste são as mais influenciadas pelo fenômeno, que provoca o aumento das tempestades. Desde o começo do ano, caíram cerca de 207 mil raios no Sudeste, contra 152 mil no mesmo período do ano passado”, diz Júnior. Em 2001, última vez que o La Niña apareceu, 73 pessoas morreram por descargas atmosféricas no País. Segundo um ranking do Inpe, que cobre nove Estados brasileiros, a cidade de São Caetano do Sul, no ABC paulista, é a campeã em incidência de raios. O motivo é a alta freqüência de tempestades provocadas pelo choque do ar úmido, que vem do litoral, com o ar abafado e quente que toma conta da capital paulista e da Grande São Paulo, em virtude da poluição. A menos perigosa da lista é Espinosa, em Minas Gerais.

raios1_58.jpg