Anatoly Berezovoy é um herói em seu país. Não podia ser diferente. Ele entrou para o Guinness, o livro dos recordes por ter passado 211 dias a bordo da espaçonave Salyut-7, em 1982, dando o pontapé inicial às acoplagens dos módulos da Estação Espacial Internacional. Aos 63 anos, ele continua na ativa e se tornou um dos papas da astronáutica. Hoje, ele é comandante no Centro Yuri Gagarin, onde o brasileiro Marcos Pontes está concluindo o treinamento antes de ir ao espaço. Quando não fala do seu ofício, Berezovoy embarca na ficção científica. No Brasil para divulgar o livro Rumo às estrelas, de L. Ron Hubbard, ele concedeu a seguinte entrevista:

ISTOÉ – No livro, os humanos exploram recursos naturais em outros planetas. Isso é possível?
Anatoly Berezovoy –
Não é à toa que a China e os EUA querem estabelecer uma base na Lua. Lá existe uma riqueza de minérios que poderiam ser beneficiados e trazidos para cá. O hélio-3, por exemplo, serviria de combustível em usinas termelétricas para a geração de energia elétrica.

ISTOÉ – O espaço está se tornando um território comercial?
Berezovoy –
A Lua é uma chance de negócios. Agora, comprar terrenos lá ou em qualquer outro canto do universo é bobagem. O nome disso é charlatanismo. Ninguém é dono do universo e não existe legislação sobre o cosmo. O turismo espacial já é uma realidade.

ISTOÉ – Se a Lua pode ser uma fronteira econômica, comprar um
terreno lá seria um bom negócio, não?
Berezovoy –
(Risos.) E certamente haverá tecnologia para manter bases lunares
em pouco tempo. Isso não significa que lá estaremos nos sentindo em casa.

ISTOÉ – Por que não?
Berezovoy –
Não há quem resista à saudade da Terra e à vida em condições normais de temperatura e pressão.

ISTOÉ – O espaço faz mal ao homem?
Berezovoy –
A ausência de gravidade causa perda de massa muscular e óssea. Lá em cima, o tempo parece passar mais rápido. Vemos 16 vezes o sol nascer e se pôr em 24 horas. Isso afeta o sono, o apetite e, depois de cinco meses, o cansaço compromete a mente. Eu sonhava que voltava para a Terra deixando a missão incompleta. O espaço é um território vazio, sem alma, sem nada.

ISTOÉ – Se é tão penoso, por que mandar humanos para lá?
Berezovoy –
Porque estamos a anos-luz das tecnologias de inteligência artificial para missões não tripuladas. Não há robôs capazes de desempenhar tarefas humanas. Pagamos por isso expondo os cosmonautas.

ISTOÉ – Faz sentido países como o Brasil, que têm problemas sociais
dramáticos a resolver, investir em pesquisas espaciais?
Berezovoy –
Pode-se discutir a prioridade desse investimento. Mas é incontestável que ele traz melhoria de vida. Os americanos gastaram US$ 25 bilhões no programa que os levou à Lua. Mas dele surgiram os chips processadores, que popularizaram o uso do computador. A cada dólar aplicado, outros US$ 5 retornaram aos bolsos da população americana, que teve acesso a benesses como o microondas, o aspirador de pó e tratamentos para doenças como a osteoporose.

ISTOÉ – O que o espaço lhe ensinou?
Berezovoy –
Somos um alfinete perdido na imensidão do universo. A lição é a
da humildade. Mas também a da força. Nunca imaginei que conseguiria cumprir aquela missão.