Se houvesse hoje uma eleição presidencial no Brasil, Dilma Rousseff poderia ter, talvez, 70% dos votos. Além do eleitorado petista, ela conquistou, com sua “faxina”, a simpatia de boa parte da classe média, da elite e daqueles que já estavam saturados com o estilo Lula. “Dilma tem muito mais compostura”, é o que andam dizendo por aí. O marco zero desse processo de diferenciação entre criador e criatura aconteceu antes da posse, quando Dilma trocou o comando do Itamaraty. Celso Amorim implorava publicamente para continuar no governo e foi substituído pelo embaixador Antonio Patriota. Mais do que uma troca de pessoas, foi uma mudança de estilos. Era o sinal de uma nova política externa, menos ideológica e mais pragmática – e não menos soberana.

O retorno de Amorim ao governo, numa área mais sensível do que o próprio Itamaraty, traz de volta ao coração do poder toda essa herança lulista: antiamericanismo gratuito, apoio ao Irã de Mahmoud Ahmadinejad, alinhamento com ditaduras e trapalhadas como o abrigo concedido a Manuel Zelaya na embaixada brasileira em Honduras. Certamente, boa parte da esquerda, especialmente aquela mais juvenil, já comemora a volta do ex-chanceler. Mas analistas experientes apostam que Dilma acaba de contratar uma crise com as Forças Armadas – e também com a opinião pública. Especialmente porque Amorim já chega ao Ministério da Defesa como uma indicação direta de Lula, que realmente não consegue desencarnar.

Há quem diga que Amorim saberá se entender com os militares porque, assim como eles, é um nacionalista. Trata-se de uma visão tosca do mundo, de quem enxerga qualquer homem fardado como uma melancia: verde-oliva por fora e vermelho por dentro. São nacionalismos distintos. Tanto Amorim como muitos militares gostariam que o Brasil possuísse uma bomba atômica. Mas as opiniões divergem frontalmente em outros assuntos, como a demarcação de reservas indígenas e o apoio cego ao regime chavista – o que, aliás, tem graves implicações militares. Além disso, a chancelaria e as Forças Armadas são as instituições mais seculares da República, e deveriam ter suas diferenças respeitadas. Por que Dilma não nomeia agora, por exemplo, um general para o Itamaraty? Vale lembrar que o primeiro
embaixador que passou pela Defesa, José Viegas, foi um fiasco.

Dilma segue em lua de mel com a opinião pública, mas suas escolhas equivocadas podem trazer problemas futuros. Na Articulação Política, ela tinha um craque à disposição, o deputado Cândido Vaccarezza, e preferiu Ideli Salvatti. Na Defesa, tinha Aldo Rebelo – um nacionalista respeitado pelos militares – e escolheu Amorim. Faltam bons conselheiros no Planalto Central. 


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