29/07/2011 - 16:23
O general Raúl Isaías Baduel diz que começa o dia rezando pela Venezuela e por seu presidente, Hugo Chávez. De sua cela no presídio de Ramo Verde, este militar condenado por corrupção em 2010 se define como um detento do presidente, de quem foi amigo, companheiro de armas e ministro.
"Em 1982, eu e Chávez prometemos não descansar até construirmos uma verdadeira democracia, mas ele parece ter esquecido esse juramento e tem o projeto de ser um presidente vitalício de uma Venezuela destruída", lamentou Baduel em uma entrevista exclusiva à AFP.
O general da reserva conhece Chávez há quase 40 anos, quando eram ainda cadetes na Academia Militar e começaram a "construir o sonho de uma democracia melhor".
No momento em que Chávez foi eleito em 1999, Baduel o acompanhou no Governo. Em 2002, quando o presidente foi vítima de um golpe de Estado falido, ele liderou a ação militar que o recolocou no poder. Mas em 2007 os dois se distanciaram em definitivo.
"Em abril de 2002 cumpri com meu dever e com a Constituição. Não sou um herói. Em 2007 me senti num dever de consciência em assumir que as coisas não estavam bem e me tornei uma pessoa triste", explicou Baduel, preso na sua cela, onde fotografias de Nelson Mandela se misturam a imagens religiosas, desenhos dos seus netos e uma bandeira dos Tiburones de la Guaira, seu time de beisebol do coração.
Em 2007, no posto de ministro da Defesa, Baruel se opôs à reforma constitucional proposta por Chávez, que foi posteriormente rejeitada num referendo. No ano seguinte ele passou de líder admirado a traidor. Foi acusado de corrupção durante sua gestão e em 2009 foi condenado a quase oito anos de prisão.
"Meu julgamento não respeitou nenhum procedimento legal. Nunca apresentaram as provas do crime, nem chegaram a um acordo sobre a quantidade de dinheiro que supostamente roubei. Eu poderia ter fugido, mas decidi ficar porque tenho a convicção de que sou inocente", afirmou o militar.
"Desde minha saída do Ministério, soube que isso poderia acontecer, mas não tinha como voltar atrás. Chávez me queria preso, rebaixado, expulso. Chamam-me de traidor. Traidor do que ou de quem? De um homem? Prefiro isso a trair milhões de pessoas", defendeu-se Baruel, medindo cuidadosamente suas palavras.
Baduel se define hoje como um "detento de Chávez", mas segue falando com respeito e cautela daquele que foi seu amigo. "Só agora acredito que conheci uma farsa. Hoje vejo que Chávez sempre teve um lado oculto", lamentou o general, de 56 anos.
Há 30 anos, o sonho dos dois jovens militares era uma democracia com divisão de poderes e Forças Armadas apolíticas a serviço do país. Hoje, Baruel define o Governo como uma "ditadura com roupagem democrática" com um exagerado "culto a pessoa do presidente" que, depois de quase 13 anos no poder, destruiu o setor produtivo do país e quer transformar os venezuelanos em um povo dependente.
"Atualmente, 60% do povo venezuelano não quer voltar ao passado nem continuar do jeito que está. A população tem que se mobilizar cívica e democraticamente porque há muita frustração acumulada, o que transformou a Venezuela em uma panela de pressão sem válvula de escape", comparou Baruel.
Mas para Baruel os problemas do país não terminariam com o fim do Governo Chávez. "A Venezuela está atrelada a duas minorias: o chavismo e a oposição. Cerca de 60% do povo não está ligado a nenhum dos dois grupos e acredita na democracia, mas caiu no desânimo porque percebe que os políticos não pensam no bem do país", observou o general.
Baduel admite ainda sentir uma "grande dor" quando vê as Forças Armadas politizadas e desinstitucionalizadas. O general relembra as muitas vezes em que tentou alertar Chávez de que "o processo revolucionário não brotava espontaneamente" dos militares. "Chávez profana nossa alma mater. Um homem que deve tanto às Forças Armadas e a massacra tanto", lamentou.
A um ano das eleições presidenciais na Venezuela, quando Chávez irá lançar sua candidatura para um terceiro mandato de seis anos, Baduel acredita que o presidente não encerrou seu caso e poderia estar preparando um indulto com fins eleitorais.
"Ele quer enfraquecer meu prestígio, derrubar minha fortaleza e de minha família. Quer que eu peça clemência, uma pena", afirmou. "Se eu me mantive tantos anos a seu lado é porque acreditava no grande sonho que idealizamos. Acredito que valia a pena segui-lo. Suponho que ainda tenho minha dose de idealismo e utopia", observa Baruel, um tanto quanto decepcionado.
Por último, quando se refere à doença do presidente, que foi operado de um tumor maligno em junho, Baruel considera que a circunstância talvez "o tenha feito pensar que também é humano". "Ele caiu na prepotência de desafiar Deus e Deus recordou-lhe o que é a vida", concluiu.