Esticar uma novela para 100 capítulos e ainda ter de reescrever vários deles devido a problemas de saúde de parte do elenco são fatos que levam qualquer autor ao stress. No caso de Glória Perez, que assina a novela global O clone, o drama é pior porque, ao contrário da maioria de seus colegas, ela trabalha sozinha. Além de Ruth de Souza (Dona Mocinha), internada por pressão alta, caíram de cama Stênio Garcia (Ali), Elizângela (Noêmia) e Reginaldo Faria (Leônidas Ferraz), todos com dengue. Apesar dos infortúnios, a história de Glória já tem um final feliz: é um dos folhetins de maior sucesso na história recente da teledramaturgia, com média de 50 pontos na medição do Ibope e picos de 55, façanha acima de seus antecessores. Fora do Brasil, El clon pega carona na extrema curiosidade dos americanos em relação a tudo o que se refere ao mundo árabe e quase dobra a audiência da Rede Telemundo, nos Estados Unidos, no horário das 22h, nas versões em inglês e em espanhol. Como diria a personagem de Solange Couto, Dona Jura, Né brinquedo, não!

O bordão, criado pela atriz com anuência da autora, está na boca do povo. A entrada em cena do núcleo suburbano, no qual se insere a exagerada Dona Jura, alavancou ainda mais a audiência, pois mostra o contraste entre os costumes dos árabes e os hábitos dos moradores de São Cristóvão, bairro da zona norte carioca. Também rende humor, como quando Mohamed (Antonio Calloni) chamou Noêmia de galinha dizendo ser um grande elogio. As cenas divertidas quase fazem esquecer que O clone é centralizado na seriíssima questão da clonagem humana e nas desgraças que cercam dois amantes afastados pelas diferenças culturais, Jade (Giovanna Antonelli) e Lucas (Murílo Benício). Sorte do telespectador, já que a trama estava excessivamente séria. As poças
de humor deixaram a novela mais leve e próxima da realidade brasileira, mesmo com a indefectível ação da Globo em glamourizar até
a vida na favela.

Festa profana – Quem também tem contribuído, e muito, para os momentos mais engraçados de O clone é Eliane Giardini, que vem dando banhos de interpretação como a irascível Nazira, a irmã dos árabes e louca por um marido. “Não vou morrer seca!”, diz, em seu constante desabafo. “Ela não é do mal. Apenas é ressentida por não ter conseguido se casar. Não sei qual será seu futuro, mas imagino que vá encontrar alguém, já que isso é o que a impulsiona”, opina a atriz. No Carnaval, Eliane fará as cenas nas quais Nazira é flagrada pelos irmãos em plena festa profana, desfilando no Rio de Janeiro. Ao contrário da atriz, “básica na vida”, a figura é uma alegoria cheia de brincos, colares, pulseiras, lenços e muita maquiagem. “Extravaso nela minha porção perua”, assume.

Com Solange Couto, a lição vem de fora. Seus muitos anos vividos em bairros do subúrbio carioca lhe deram um arsenal de informações importantes para fazer a dona de um bar em São Cristóvão. “Existe um vocabulário local e eu uso algumas coisas. São palavras como vinida (avenida) e sprito (espírito) e expressões como “quando me espalho ninguém me junta” (que significa o pau vai quebrar), ou “se esparrama que nem pé de batata” (sobre alguém invasivo).” Solange acha que o clima do bairro está muito bem representado. “Moro em Itanhangá. Lá, vizinho ainda se mete na vida alheia”, conta a atriz, ex-mulata de Sargentelli, que andou sumida da televisão e agora volta em grande forma. Se na vida real Glória Perez sofre por ver os indultos concedidos a Guilherme de Pádua e Paula Thomaz, condenados pelo assassinato de sua filha, Daniela Perez, na ficção ela é agora brindada com o sucesso feito em clima de muito bom humor.