A ciência trava uma incansável guerra contra minúsculos e letais inimigos da raça humana. Transportando para a realidade as mais aterradoras obras de ficção, os vírus e as bactérias estão redefinindo o significado da palavra hipocondria. Hoje, não há mais limites nem excessos nas preocupações com ameaças à saúde. Ainda distante do Brasil, mas nem por isso menos preocupante e assustador, o H5N1, o vírus da gripe aviária, contagiava apenas aves e porcos. Isso até 1997, quando em Hong Kong, de alguma maneira, atravessou a fronteira que separa as espécies e começou também a infectar humanos. Reapareceu em 2003 na Coréia do Sul e se espalhou pela Ásia. A gravidade é tal que os governos do mundo se equipam para evitar uma pandemia.

Também letal, mas sem os riscos de uma pandemia, a febre maculosa já fez quatro vítimas fatais no Brasil. Ela é provocada por uma bactéria, a Rickettsia rickettsii, que tem o carrapato-estrela como hospedeiro. Uma de suas vítimas foi mordida quando cuidava do stress e percorria uma bucólica trilha de montanha em uma pousada em Itaipava, no Rio de Janeiro.

Todo o cuidado é pouco. Mas mesmo assim há quem pouco cuide. Esta semana,
o descuido causou a morte da menina Bruna Torres de Oliveira, de apenas nove anos, em um hotel paradisíaco, em Pernambuco. Bruna foi uma das 21 pessoas atingidas por um surto de infecção alimentar. E aí vem o descuido: investigações comprovaram que os alimentos eram armazenados no hotel sob temperaturas favoráveis à proliferação de bactérias. Presume-se que ela foi vítima da bactéria shigella em associação com o vírus rotavírus. Ambos transmitidos por água ou alimentos contaminados.

Mas não é só a saúde que requer cuidados. Também descuidados têm sido,
através da história, os povos ricos em relação aos mais pobres. Frutos desta semente cruel, o preconceito e a indiferença são regidos pelo egoísmo e pela ganância. E foram o preconceito e a indiferença os causadores dos graves distúrbios que obrigaram o governo francês a implantar o toque de recolher nas periferias de Paris e em várias cidades da França. Reagindo ao vírus do preconceito e da indiferença, os jovens excluídos dos subúrbios, na sua maioria imigrantes, incendiaram desde o dia 27 de outubro quase oito mil carros e já causaram uma morte. E, como bactérias criadas na alta temperatura da intolerância, os violentos protestos estão se espalhando pela Europa.

É bom que os governos sejam menos descuidados e se preparem para que isso não se torne uma pandemia. E a terapia é óbvia: que se criem vacinas contra o preconceito e a indiferença. Isso vale para o mundo e também, é óbvio, para o Brasil.